LEFT caucus — coordenar alternativas de esquerda no Parlamento Europeu

Se há coisa que a atual crise deixou clara é que há problemas europeus que exigem soluções europeias. E, em democracia, isso quer dizer que necessitamos de alternativas à escala europeia. Construir essas alternativas é um trabalhado vasto e multifacetado que necessita de persistência e abertura de espírito — criar uma atitude comum que supere as linhas de demarcação partidárias e regionais mas que tenha consistência política e ideológica. O LEFT caucus — em cujo projeto tenho estado envolvido desde que cheguei ao Parlamento Europeu, pretende lançar-se a essa missão. Começámos com um pequeno grupo de discussão entre deputados da Esquerda Unitária, dos Verdes e dos Socialistas de diversos países e comissões parlamentares. Éramos pouco mais que uma dezena. Agora chegou o momento de apresentar em público o caucus — numa sessão no Parlamento Europeu, em Bruxelas (ver cartaz) —. Em junho faremos a segunda reunião ordinária e esperamos estar a todo o gás na rentrée em setembro. Pretendemos ser um fórum de coordenação de políticas de esquerda, de criação de uma nova maioria progressista, e de consolidação de um discurso consistente, realista e mobilizador. Começam já a chegar novas inscrições de outros deputados. E qualquer pessoa pode inscrever-se e começar a receber as nossas informações, que nos primeiros tempos serão a conta-gontas, mas que ganharão outra força conforme formos apresentando documentos políticos, iniciativas legislativas, e textos para debate. Para tal basta consultar o site, onde encontrarão também a nossa declaração de intenções (para já tudo em inglês; versões noutras línguas estão dependentes da boa vontade do gabinete de cada eurodeputado e deverão aparecer mais no futuro). LEFT não quer apenas dizer “esquerda” em inglês; é também a abreviatura de “liberté, égalité, fraternité: toujours” em francês — o que para nós significa um regresso às fontes da esquerda enquanto uma aliança das pessoas comuns, uma coligação daqueles que não são ricos nem poderosos — e que precisam de fazer ouvir a sua voz na Europa de hoje. Ajudem-nos a construir essa alternativa.

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Mélenchon: “Há que vergar o tirano antes que ele vergue a revolução”

Em entrevista ao Libération, o eurodeputado do GUE/NGL, candidato presidencial francês e copresidente do Parti de Gauche, que com os comunistas franceses faz parte da Frente de Esquerda, responde às seguintes perguntas sobre a Líbia. Tradução de alguns excertos. Porque apoia os ataques aéreos na Líbia? A primeira questão que temos de nos colocar é a seguinte: há um processo revolucionário no Magreb e no Médio Oriente? Sim. Quem faz a revolução? O povo. É pois decisivo que a vaga revolucionária não seja quebrada na Líbia. Bastaria que Kadhafi ganhasse para que a mensagem passasse a ser: “aquele que bater durante mais tempo e com mais força no seu povo durante uma revolução, ganhou”. Ora isto seria um sinal desastroso, uma vitória da contra-revolução! A minha posição é constante: sou partidário de uma ordem internacional garantida pelas Nações Unidas. Mas conhecemo-lo bastante mais crítico contra as intervenções militares… porque votou favoravelmente, por exemplo, a resolução no Parlamento Europeu?

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Situação em Lampedusa agrava-se

IMMIGRAZIONE/LAMPEDUSA: GOVERNO ITALIANO APPLICHI DIRETTIVE EUROPEE, NAVI E TENDOPOLI NON SONO LA SOLUZIONE Le informazioni che giungono dalla stampa e dalle associazioni presenti sul posto indicano che sull’isola italiana di Lampedusa la situazione è al collasso: non si puo’ parlare di accoglienza dignitosa di fronte a profughi che da giorni dormono all’addiaccio, non hanno a disposizione acqua corrente, non ricevono abbastanza cibo nè cure mediche appropriate. » Lo dichiara Rui Tavares, europarlamentare portoghese della Sinistra Unitaria Europea e relatore del Parlamento europeo sui rifugiati. Chiediamo prima di tutto che il governo italiano non lasci sola l’isola di Lampedusa a gestire l’afflusso e si impegni ad aumentare sensibilmente il numero di profughi trasferiti ogni giorno nel resto d’Italia in strutture aperte idonee all’accoglienza. In questo quadro, le ipotesi ventilate di confinare i profughi su una nave militare o in tendopoli improvvisate non sarebbero certo conformi agli standard europei.

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Sobre a Líbia

Apenas uma certeza: aplaudir os corajosos líbios numa semana e deixar que eles se lixem na seguinte é uma indignidade.   Há certo alvoroço na blogosfera sobre o voto de uma resolução do Parlamento Europeu àcerca da Líbia (sem ser exaustivo, cito o Renato Teixeira e o Bruno Carvalho do 5dias, e uma série de comentadores num texto do Miguel Portas e da Marisa Matias no esquerda.net, entre alguns outros). Esse alvoroço vem acompanhado de uma fúria inquisitorial que, tratando-se do assunto de que se trata, é vergonhosa. No texto que escreveram, o Miguel Portas e a Marisa Matias responderam muito bem ao estilo e ao fundo da questão e eu subscrevo grande parte do que dizem. Aproveito para acrescentar algumas coisas do meu lado. Sobre mim em particular, queixam-se os ditos bloguers e comentadores de 1) não terem lido nada (aliás, por culpa deles, como se verá) que eu tivesse escrito àcerca do voto da resolução sobre a Líbia no PE; 2) eu ter votado de forma diferente dos meus colegas na delegação do BE ao PE. Acima usei a expressão “fúria inquisitorial”, mas talvez não seja o bom termo, e por uma razão: os inquisidores eram diligentes e não deixavam nada por consultar. Ora, se os meus acusadores fossem minimamente diligentes teriam notado que eu — longe de me remeter ao silêncio — fui o primeiro eurodeputado português a escrever sobre a resolução e sobre o meu voto, já há quase uma semana, e era até o único europdeputado português a tê-lo feito bem antes de esses acusadores terem acordado para o assunto. Fi-lo aliás menos de uma hora depois do voto, através do meu twitter, que é retransmitido no meu blogue e até no portal oficial dos eurodeputados do BE. E nesse mesmo momento respondi a perguntas, em directo e ao vivo, sobre se o meu voto era diferente do voto do Miguel e da Marisa (vejam se percebem o seguinte: no PE a regra é a liberdade de voto, felizmente). Prestação de contas mais rápida é difícil, mas enfim, escapou a observadores que deveriam ser atentos. Em particular, gostaria de saber que raio de jornalista é o Renato Teixeira que não fez uma pesquisa básica nos meios oficiais de comunicação do deputado e da delegação sobre os quais escreve incessantemente desde há dias. Mas não percamos tempo. Então, que temos na Líbia?

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Só mais uma coisinha

Idealizo um reinventar laços de solidariedade entre trabalhadores, entre gerações e pessoas diferentes. Sim, eu tinha prometido calar-me durante a quaresma. Mas o que aconteceu anteontem, no protesto da geração à rasca que juntou centenas de milhares de pessoas de todas as gerações em todo o país, foi especial — e necessita de um comentário especial. A coisa mais interessante a descobrir é como se pode ir de três pessoas para trezentas mil sem pedir permissão a qualquer partido, sindicato ou associação. Não tenho dúvida de que qualquer destas organizações está agora a repensar a sua relação com a sociedade — e isso é bom, mas desde que dê aos partidos vontade de serem organizações mais democráticas desde o início. Segunda coisa: um cartaz de ontem dizia “ninguém aqui votou na Merkel”. Na mouche: a União Europeia, tal como está, é um clube e não uma democracia. Aos olhos das pessoas, esse dado básico retira legitimidade às reformas que aí vêm, e com razão diagnostica a falência do atual discurso reformista. Até que uma nova relação de forças ou um novo pensamento tome conta de Bruxelas, das reformas só podemos esperar coisas contra nós. A estratégia tradicional-revolucionária quando chegamos ao “estado a que chegámos” seria pressionar até à queda do poder, para que viesse aí um novo poder. Mas aí temos novo bloqueio: não tanto que o “novo poder” se arriscaria a ser pior do que o atual — mas que, passado o primeiro momento, as coisas voltariam a ser dirigidas de cima para baixo. Há uma semana inventei uma palavra — à volta da ideia de “reformulação”

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A batida cardíaca semanal

(Público – 09 de Março de 2011) A realidade muda, o mundo muda, o país muda mais do que pensamos; e consoante muda eu vou mudando também qualquer coisa. Essa é a explicação oculta no título da coluna. Certa noite há pouco mais de cinco anos, cerca das duas horas da manhã, recebi um email do então diretor deste jornal que me perguntava se eu estaria interessado em ser cronista do Público. Demorei um pouco — alguns dias mesmo — para me convencer de que a proposta era fidedigna. Na altura eu estava praticamente desempregado (ou o que quer que isso queira dizer na terra dos recibos verdes) o blogue em que eu escrevia tinha acabado, e tinha apenas a meu crédito um livro recente sobre 1755 e outro em preparação onde, aliás, lançava cobras e lagartos sobre os editoriais de José Manuel Fernandes — nem mais nem menos, o então diretor deste jornal. Pelos vistos duas ou três pessoas tinham-lhe referenciado o meu nome para novo cronistas e, apesar das nossas diferenças, fizemos a ideia funcionar. Eu não discuti dinheiros (brinquei que me poderiam pagar o mesmo que a Frei Bento Domingues, que é franciscano) e a direção do jornal aceitou que eu escrevesse semanalmente e não quinzenalmente como inicialmente proposto. E foi tudo: a primeira crónica saiu em março de 2006 (se não erro) e chamava-se “O que faria Voltaire?”.

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Os reformulocionários

(Público – 07 de Março de 2011) O reformulocionário pretende baralhar e dar de forma mais justa, não tomar conta do jogo mas alterar-lhe as regras, ou seja: mudar a fórmula. O protesto da “geração à rasca”, que foi convocado por três amigos no Facebook e que terá lugar em Lisboa, Porto, Viseu e várias cidades no próximo dia 12, arrisca-se a ser o momento político mais interessante deste ano ainda curto e — a correr bem — a única verdadeira novidade nacional dos últimos tempos. Não só pela justiça do seu objeto mas sobretudo pela maneira de fazer. Tentarei descrever o que acho que se está a passar. Durante o século XX as políticas transformadoras declinavam-se de duas maneiras: ou éramos revolucionários ou reformistas. À esquerda esta dicotomia consumiu décadas de debate, com hegemonia para os revolucionários primeiro e os reformistas depois, até alguém superar o dilema notando (corretamente) que reforma ou revolução eram formas de fazer e não ideais em si mesmos. Mesmo nessa acepção mais modesta, porém, os partidários de ambos os métodos acabaram perdendo o pé. Os revolucionários primeiro, ao validarem a transição por períodos anti-democráticos — mais ou menos prolongados — até ao destino redentório que não chegava a chegar. E os reformistas também já tiveram mais credibilidade: em primeiro lugar abusaram da palavra até ao ponto em que “reforma” hoje já não vale nada em que se acredite. E quando tem significado que se perceba (cortes de salários?) reforma em boca de político quer agora dizer “um período em que a gente comum vai ter de sofrer mais um bocado”. Em ambos os casos, para os amanhãs poderem cantar os hojes terão de gemer. No seu melhor não teria de ser assim, mas na verdade reforma e revolução acabaram padecendo do mesmo vírus: o dos fins justificando os meios. Entram em cena os reformulocionários.

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Do mesmo, mas em maior

A União Europeia está muitas vezes condenada antes de ser julgada, e eu queria evitar isso nessa crónica, então esperei por uma série de audições parlamentares para ter uma oportunidade de ser mais justo. Ouvi e questionei, entre outros, a Comissária dos Assuntos Internos e o Secretário-Geral dos Assuntos Externos, ou seja, os números 1 e 2 para o que se passa dentro e fora de fronteiras da União. O assunto era, evidentemente, a “revolução árabe” e as suas consequências. O meu veredito? Bem, os responsáveis tentam esforçadamente dar a impressão de que, desta vez, não querem ficar aquém do desafio. E apresentam-nos números, números de guardas fronteiriços e de patrulhas, e medidas preparatórias, para mostrar que estão preparados. Mas como sempre, os responsáveis europeus estão preparados para a crise do passado, e nunca para a do presente. Para nos impressionar, dão-nos o mesmo, mas em maior. Vejamos: perante a situação na Líbia, e em resposta à pressão da Itália, a Comissão Europeia apresenta-nos uma operação fronteiriça. Uma operação grande, inflacionada e, se for preciso, até gigante, mas uma operação fronteiriça. O trivial em grande e, no entanto, completamente ao lado do alvo. E, no entanto, a realidade está aí:

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Encontros de Baucau

Díli, Timor-Leste. — Estive aqui em Timor há ano e meio e, tirando aeroportos e desembarques, comecei a minha viagem pelo primeiro lugar onde os portugueses pisaram — o enclave de Oecussi-Ambeno — e terminei por onde eles em último lugar hastearam a bandeira — a  Ilha de Ataúro. Calhou simplesmente assim. A meio da viagem, encontrei a Felicidade em Baucau. Felicidade Neto Ximenes, vinte e tal anos, funcionária da pousada, falante de tetum, português, indonésio, inglês e da língua local, macassai. E seria certamente capaz de se fazer entender em qualquer mistura destes idiomas pela simples força de vontade e pelo sorriso. Partimos em missão pela região leste da ilha, até ao cume do monte Matebian, onde havia uma comemoração, e regressando pela aldeia de Venilale. Mas não se pode acrescentar felicidade à Felicidade sem a acompanhar ao lago escondido por um palmar entre duas encostas da montanha, ou sem enfiar pelos túneis que os soldados japoneses escavaram na ilha, e sem ouvir as histórias da resistência e da guerrilha. Não consegui impedir-me de pensar que a cooperação e desenvolvimento local funcionará no dia em que por cada funcionário internacional que cessar o contrato se descubram dez Felicidades. Ao regressar a Baucau, tínhamos tido uma ideia:

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A Grande Jaca

Jacarta, Indonésia. — Não é por falsa modéstia que os indonésios não gostam de ser apresentados como a “história muçulmana democrática de sucesso”. É pela insistência na parte “muçulmana” mesmo. E não é que eles não sejam muçulmanos — são-no, na sua grande maioria, embora sejam também hindus, budistas, cristãos, ahmadianos (uma seita islâmica com cada vez mais adeptos que considera que Maomé não foi o último profeta) e também muito seculares. Mas foi enquanto indonésios que conquistaram a democracia, e chateia-os que lhes queiram tirar isso. “Você gostaria que apresentassem Portugal apenas como um exemplo da compatibilidade entre democracia e catolicismo?”, pergunta-me um diplomata que aqui serviu duas vezes e muitos anos. Por ridículo que pareça, não é que isso não tenha sido sugerido no nosso tempo — houve uma altura, e foi há uma geração apenas, em que só exceções entre os países católicos se podiam contar como democráticas. Foi Portugal a Tunísia do mundo católico? Poderia, sei lá, explicar-se as católicas Filipinas através de Portugal, só por causa da religião? Para a maioria dos indonésios, a questão “muçulmana” não faz sentido.

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