[Solicita-se divulgação!] Uma lição aberta, na quinta feira.

Caros amigos: O cartaz acima é o primeiro de muitos que divulgarão uma nova iniciativa: as Conferências de Lisboa. A ideia nasceu-me depois de ter apresentado “A lição do vereador republicano” no Salão Nobre dos Paços do Concelho de Lisboa, aqui há uns meses. Perante aquela estupenda sala, com a sua histórica varanda de onde foi proclamada a República Portuguesa, em 1910, pensei: não seria fantástico se os cidadãos soubessem que todos os dias, a uma certa hora, poderiam ali entrar de graça e assistir a um recital de poesia, um concerto de alunos do Conservatório, uma palestra sobre os temas mais variados? Fala-se muito na criação de novos espaços para a cultura, mas Lisboa tem já muitos espaços magníficos que precisam antes de outra coisa: rotinas. Saber que existe, saber que funciona com horários regulares, saber que a qualidade é assegurada e constante e, acima de tudo, saber que é para todos. O acesso livre e geral ao conhecimento, à arte e à cultura estão na base dos ideais de que eu falava na tal lição do vereador republicano. Passei a ideia à vereadora da cultura, Rosalia Vargas, que me perguntou porque não propunha eu algo de formal à CML. E talvez não o tivesse feito se o Tiago Ivo Cruz, assistente do vereador Sá Fernandes, não se tivesse oferecido para ajudar no trabalho de acompanhar a ideia. Graças ao apoio dos dois vereadores, ao trabalho do Tiago, e à ajuda do Zé Nuno Pereira (que está a construir este sítio e a tratar da transmissão via streaming das palestras) e da Vera Tavares (que desenhou este belo cartaz) conseguimos levantar esta ideia em pouquíssimo tempo e com trabalho extra e voluntário de toda a gente. Começámos pelas “Lições Abertas”, que parte do pressuposto de que trabalham em Lisboa, de forma independente ou distribuídos pelas suas universidades, intelectuais de carreira distinta a que a cidade deve a sua homenagem e que — por outro lado — podem dar ao grande público palestras sobre as mais variadas áreas do conhecimento. O primeiro nome que decidimos convidar, o de José-Augusto França, é certamente um desses: um dos grandes historiadores da arte e da cultura em Portugal, cuja obra sobre a Lisboa pombalina foi uma completa novidade na historiografia da época e cujos três volumes sobre o romantismo em Portugal são um manancial de informação e um deleite de leitura para quem os ler. José-Augusto França não tem parado nos últimos anos, escrevendo ficção ou publicando agora o seu Lisboa, História Física e Moral, um volume de quase novecentas páginas que é o resultado de décadas de investigação e reflexão sobre a cidade. Já há muito tempo que José-Augusto França merecia ser celebrado por Lisboa. Estas não serão conferências da cidade sobre ela mesma. Os temas são livres e da responsabilidade dos oradores. Nas próximas semanas teremos palestrantes das áreas do Design (Henrique Cayatte, no dia em que é inaugurado o Museu do Design e da Moda), História Política (Fernando Rosas, no dia 28 de Maio que se convencionou ter terminado com a Iª República), Musicologia (Salwa El-Shawan Castelo-Branco, especialista nas ligações entre o Fado e o Médio Oriente), Filosofia (José Gil, célebre pelo seu Portugal, o Medo de Existir), Filosofia da Ciência (Olga Pombo, que este ano tem estado nas comemorações darwinianas) e Matemática (Nuno Crato, que dará um passeio matemático pela cidade de Lisboa). E voltaremos após o Verão com novas Lições Abertas e outros desenvolvimentos desta ideia. A primeira palestra será já na quinta-feira dia 14. Estou ao mesmo tempo ansioso para ver José-Augusto França falar no Salão Nobre e ver o Salão Nobre cheio para o ouvir. Solicito por isso divulgação a todos os blogues e à imprensa. Vamos criar um novo hábito cultural na cidade?

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Gritai pelo Bloco Central!

O Engenheiro Sócrates quer que sejamos gastadores e a Doutora Ferreira Leite quer que sejamos poupadinhos? Seremos gastadinhos. Não à força de acreditarem eles mesmos, mas à força de querer que os outros acreditem, há gente que ambiciona converter uma ideia má que dá jeito na única ideia que resta para salvar o país. Foi assim com a União Ibérica, em 1870. É assim com o Bloco Central, em 2009. Por conseguinte, talvez baste parafrasear o que escreveram os autores d’As Farpas sobre o primeiro assunto, substituindo-o por termos do segundo. Tentemos: “O Bloco Central é um talismã que temos em nosso poder como instrumento de realização de todos os sonhos, mas de cujo uso persistimos estupidamente em nos abstermos! Tendes fome? Gritai pelo Bloco Central à mesa de um café, e os criados vos trarão bifes com batatas. Esta é a receita para satisfação de todas as necessidades nacionais! Experimentai-a, ó insensatos! ó cegos!” O Bloco Central é, efectivamente, muito prático.

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Небольшая книга о Великом Землетрясении.

Небольшая книга о Великом Землетрясении. Очерк 1755 года. (Nebol’shaia kniga o Velikom Zemletriassénii. Otcherk 1755 goda – O Pequeno Livro do Grande Terramoto. Ensaio sobre o ano de 1755) São Petersburgo, Imprensa da Universidade Europeia de São Petersburgo, 2009. Em Novembro de 2005 recebi um email de uma colega historiadora da arte, Olga Roussinova, que tinha colaborado com o Museu do Hermitage e dava aulas na Universidade Europeia de São Petersburgo. Ela tinha estudado a forma como as catástrofes de São Petersburgo no século XIX — grandes inundações inesperadas, principalmente, causadas pelo degelo primaveril — tinham sido vistas pela Europa da época, e estava curiosa por saber se haveria semelhanças com a recepção do Grande Terramoto em 1755. Além disso, estava cada vez mais interessada pelo mundo lusófono e pela cultura portuguesa (mais tarde viria a Lisboa para encontros entre académicos eslavos e ibéricos) e tinha ficado interessada no meu livro, de que lhe enviei uma cópia. Muitos emails e visitas a Lisboa depois, ganhei uma amiga, além de uma leitora inteligente e uma colega brilhante. Este livro cuja capa reproduzo acima a ela o devo. Foi a Olga Roussinova que achou que ele teria qualidade e interesse para os leitores russófonos. Foi ela que, nos dois extremos da Europa, tratou das burocracias e dos apoios necessários. Foi também ela que conseguiu interessar para o projeto uma tradutora conceituada e cuidadosíssima, Elena Golubeva. E nada disto foi fácil: pelo meio, ainda houve um fecho suspeito da Universidade Europeia e da sua editorial antes das eleições russas, um caso que deu que falar aqui e aqui. Para coroar a aventura, a Olga Roussinova ainda me honrou com o prefácio ao livro. Compreendam então que use este blogue para um agradecimento pessoal à amiga e colega: Спасибо больщой, Ольга!

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A vingança da União Nacional

Na Ferreiralândia, o ideal mesmo era não aparecermos no mapa para “eles” não saberem que existimos. Assistir a uma entrevista a Manuela Ferreira Leite começa a ser uma sofrida sucessão de sentimentos: impaciência, nervosismo, pena, desconforto, incredulidade, pena outra vez e — crucialmente — síndrome da vergonha alheia. A gente torce-se na cadeira ao ver como Manuela Ferreira Leite se torce na cadeira, a gente cerra os dentes à espera da próxima pergunta, a gente respira fundo porque a pergunta é fácil e, finalmente, a gente pergunta como foi possível. Sim, é assim, e vocês sabem do que eu estou a falar.

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Nem todo o pretérito é imperfeito

[A ver se aproveito a ocasião para blogar aqui mais do que apenas as crónicas do Público] Recebi hoje várias respostas à crónica sobre Manuela Ferreira Leite, que estará aqui publicada mais tarde. Um dos comentários a este post meu é até bastante magoado — o que não julguem que me agrada. Simplesmente, pergunto-me se deveremos submeter a presidente do PSD a uma fasquia menos exigente do que aquela que usamos para outros líderes partidários. Não estou a ver que se perdoasse a Sócrates, Portas, Jerónimo ou Louçã o tipo de gaffes e atrapalhações que têm ocorrido a Manuela Ferreira Leite. E espero que os seus apoiantes não comecem a usar a tática “da incubadora” que tão maus resultados tem dado com todas as lideranças do partido. Interessante é a forma como o 31 da Armada, logo repescado por diversos blogues de direita, encontrou para reenquandrar o meu comentário ao atual PSD: Rui Tavares afirma que Manuela Ferreira Leite acabou com “o partido do risco, da internacionalização e da concorrência”. Notável. A exaltação dos méritos passados dos adversários com intenção de aumentar o contraste com as misérias actuais não é uma inovação retórica desta dupla de euro-candidatos. Mas apetece perguntar por onde é que andavam estes retro-adeptos quando o PSD era o partido fantástico que descrevem. Vamos lá ver: acho que qualquer observador honesto terá de reconhecer que em tempos o PSD foi isso mesmo, o partido que defendia o risco e a competição. Tal como terá de reconhecer que houve — e em certa medida ainda há — uma esquerda isolacionista e terceiro-mundista. E daí? Isso significa apenas que o PSD desse tempo, auto-confiante e encorajador, era um adversário temível. Sei do que falo: andámos os anos 80 e metade dos 90 a perder eleições para eles. Isso não quer dizer que um tipo de esquerda tivesse de ser PSD, mas antes que tinha de se esforçar para superar o isolacionismo que ainda havia à esquerda, defendendo que Portugal não tinha nada a temer por se aproximar do resto da Europa ocidental. Por outro lado, não me deixa feliz ver Manuela Ferreira Leite usar o tipo de argumentos a que eu chamo “a vingança da União Nacional sobre a Ala Liberal”. Claro que isso faz do PSD um adversário mais débil. Mas eu preferiria ver o PSD não regredir para uma posição em que já temos medo de um comboio para Madrid. É mau para todos, e principalmente para os simpatizantes do PSD, que no fundo conhecem bem aquilo de que eu estou a falar. ADITAMENTO [em resposta a um leitor]: Respondi ao seu comentário e a outras críticas à minha crónica de hoje no meu blogue. Reenvio-lhe essa resposta através deste mail. Queira crer que a atitude de um cronista que escreve uma crónica como a de hoje é ambivalente. Se existe algum prazer inegável na prosa satírica, também me compadece escrever sobre alguém contra quem não tenho qualquer ânimo negativo. A pergunta que me faço sempre é: se fosse outro líder partidário a dizer isto seria poupado? Os líderes de esquerda são poupados quando dizem disparates? A minha crítica é justa? A resposta a estas perguntas é que, evidentemente, acho que a minha crítica é justa, embora implacável — ou não a teria publicado. Não nos esqueçamos que os líderes políticos o são por sua própria escolha e ambicionam governar o país. O cronista, quando começa a sentir pena deles, deve perguntar se esse sentimento não o impede de cumprir a obrigação de estimular e alertar o debate público. É minha opinião que se começamos a poupar muito os políticos ficamos mal servidos: por exemplo, por alguém que pode chegar a primeiro-ministro sendo receoso ao ponto de ter medo do TGV (o que é bem diferente dos outros argumentos sobre a oportunidade e os custos da obra, como tive ocasião de notar).

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Os próximos treze anos

Daqui a treze anos, a nossa democracia fará 48 anos e ultrapassará em duração a ditadura. O país terá finalmente vivido mais tempo em liberdade do que em opressão. Acha Rui Rio que não é em ano eleitoral que se consegue fazer um combate sério à corrupção. Pois, claro. Nos anos não-eleitorais, como todos sabemos, o combate à corrupção tem sido seríssimo. Também todos sabemos que um antigo vice de Rui Rio, Paulo Morais, saiu da Câmara do Porto denunciando a corrupção na administração local como “um cancro” e declarando que “Rui Rio já não tira o sono aos interesses instalados”. Quem sabe? Talvez Rui Rio ache que o combate sério à corrupção passa por deixar os interesses instalados tão tranquilos que os possamos apanhar enquanto estão a dormir. Mas qual é, afinal, o problema dos anos eleitorais?

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Preventivo e universal

As declarações do ministro das finanças sobre reunir “pela imprensa” suspeitas contra o contribuinte x ou y também não me descansam nada. Então vai continuar a ser possível fugir aos impostos desde que se seja discreto? E que garantia temos de que o sigilo não será quebrado arbitrariamente   Como é viver num país sem sigilo bancário? Posso explicar. Estudei por uns anos num país onde era frequente os meus colegas bolseiros regressarem às suas terras de origem para fazer os seus “trabalhos de campo”. Durante os seis ou sete meses que passavam fora, as bolsas continuavam a ser depositadas nas suas contas bancárias. Quando regressavam, os meus colegas podiam encontrar já à sua espera uma carta das finanças que os alertava para a necessidade de pagar imposto por aquele montante, agora já considerável, que tinham acumulado. Só que — em geral — as bolsas de estudo não são tributáveis. Bastava então que o interessado se dirigisse às finanças para mostrar os recibos correspondentes. Uma vez justificado o montante não havia impostos a pagar e o assunto estava encerrado. Era chato? Sim, mas não mais do que as obrigações fiscais correntes. Atentatório da privacidade?

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O barulho do contrato que se rompe

Que o novo contrato ia falhar ficou claro quando os estudantes começaram a ser empurrados para os empréstimos bancários. Foi o próprio estado, via Caixa Geral de Depósitos, o pioneiro na introdução das gerações mais jovens ao endividamento (lembrem-se disto quando vos disserem que o povo foi imprevidente no recurso ao crédito). Atenção: segue-se a temível frase “no meu tempo”. No meu tempo de Universidade, havia um contrato mais ou menos claro entre os estudantes, as famílias e o estado. Esse contrato partia do pressuposto de que o ensino era “gratuito”, ou seja, que não eram os alunos que pagavam directamente os salários aos professores, mas os seus pais através dos impostos. O corolário era simples: se estudares, entrarás no ensino superior, de preferência público, de preferência perto de onde moras. O estado pagará aos professores com os impostos dos teus pais, e os teus pais pagarão directamente as outras despesas com livros, alimentação e alojamento. Não era um contrato perfeito, mas era simples — e foi o que permitiu o acesso ao conhecimento por parte de uma geração de gente sem dinheiro na família. Nos anos 90 apareceu uma nova proposta de contrato.

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Uma nova simplicidade

há dois tipos de simplicidade. A simplicidade estúpida: o fascismo, a ditadura, a agressividade e a guerra. E a simplicidade inteligente: a democracia, a participação, o pluralismo e a cooperação pacífica. Ali por 1998 li um exuberante artigo anunciando a “Nova Economia”. A vulgarização da internet, ainda no início, iria mudar tudo: veríamos nascer novas formas de trabalho e de distribuição numa rede potencialmente infinita à escala global. Cada um dos nós dessa rede, defendia o autor, mudaria os pressupostos da velha economia. Não havia nenhuma razão para crer que os habituais ciclos de expansão e retracção se mantivessem neste novo mundo com novas regras. Estávamos à beira de uma economia de crescimento interminável; provavelmente, já tínhamos até entrado numa era sem recessões. Tudo bem: seria fácil escarnecer da ingenuidade hiperbólica deste artigo.

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