O porvir, sim, o porvir

Aquilo que eu vi, portanto, — e viu quem quis ver — é um indício do que poderá ser a Europa após 2014. A isto acrescente-se a direita austeritária em países como Portugal, esquecida do papel que teve na construção do estado social e desejosa de reviver episódios empoeirados do passado. E o que temos é uma metade do tabuleiro político sequestrada. E sabe-se que eu não estou propriamente otimista quanto ao estado da restante metade.”  Vi o futuro, e não é bonito. Vinte e três anos depois de lhe ser atribuído o prémio Sakharov, a líder birmanesa Aung San Suu Kyi, que passou a maior parte desse tempo em prisão domiciliária, veio finalmente a Estrasburgo para recebê-lo. A sua presença é incomparável. Quando começa a falar, fá-lo com frases simples, harmónicas, graciosas. “A liberdade de pensamento começa pelo direito de fazer perguntas”, diz, e faz uma pausa. “Nunca aleguei que a democracia fosse perfeita”, recomeça, “mas não existe algo de agradável e estimulante na imperfeição?” Quando nos levantamos para aplaudir, tenho na cabeça outra frase dela: “hoje fizemos progresso, não o suficiente, mas progresso”. Vale a pena nãodesistir. Mas depois preparamo-nos para os votos. O relatório seguinte é o da colega portuguesa Edite Estrela, sobre “Saúde sexual e reprodutiva”, que votámos na Comissão dos Assuntos das Mulheres com uma larga maioria. De repente, os deputados da extrema-direita, que no debate da véspera eu ouvira considerarem “anormais” os homossexuais e proclamarem que a reprodução é o único propósito do sexo, começam a agitar-se nas cadeiras. Um deputado conservador pede que se considere o adiamento do voto. Com um pouco de amadorismo à mistura, instala-se a confusão. Há pateadas, urros, uma cena mais digna de um jardim zoológico do que de um parlamento. A vozearia sobe e alarga-se ao resto da direita. Quando finalmente se vota, os reacionários conseguem o seu intento: o relatório é adiado.

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Rejeitar o orçamento, Afirmar alternativas

O Congresso Democrático das Alternativas apresenta nesta quinta-feira, 31 de Outubro, às 21h no auditório do Liceu Camões (Lisboa), o debate: “Rejeitar o orçamento, Afirmar alternativas”. A abertura será feita por  Sandra Monteiro, seguindo-se o debate com José Maria Castro Caldas, Pedro Nuno Santos e Mariana Mortágua. O encerramento ficará a cargo de Ricardo Paes Mamede.

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Um caso exemplar

A mesma Comissão que tem sido menos ativa do que desejável a defender o artigo 2 — em casos de países da União em que o estado de direito está de facto em causa — foi demasiado ativa a desrespeitar o artigo 4, no caso português, por razões que nada têm que ver com os “valores da União”. Vale a pena dedicar alguma reflexão à nota (supostamente interna) da delegação da Comissão Europeia em Portugal sugerindo que o Tribunal Constitucional português é um “legislador negativo” e responsabilizando-o, em caso de recusa das novas medidas de austeridade, por um segundo resgate a Portugal e pelo colapso do governo. Para tentar entender a gravidade do que se passou, busquemos os tratados da União, como reformados por Lisboa. Sãobichos esquisitos, com algumas coisas boas e muitas más, mas para este caso os artigos relevantes são simples. O leitor interessado pode procurar na internet por uma versão pós-Lisboa do Tratado da União Europeia e conferir por agora os primeiros quatro artigos. Vai ver que não perde o seu tempo; afinal, estamos metidos nisto e informação é poder. O primeiro artigo diz:

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Relatório Iacolino

O relatório Iacolino — sobre criminalidade organizada, corrupção e branqueamento de capitais — foi aprovado hoje. Esta a minha intervenção no respetivo debate.  

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Documentaire Ulysse

Alô Strasbourg! Ce soir à 20h15 au cinéma Odyssée (près de la Place Kleber), l’avant-prémière du documentaire Ulysse – comment sortir de la crise et sauver l’Europe. Filmé dans les pays de la crise, pour découvrir les chemins de la reconstruction. L’entrée est libre. Venez tous et toutes!

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Tirar a Pedro para dar a Paulo, SA

Havendo folga, a descida deveria ser no IRS: uma folga para as pessoas, e não para as empresas, permitiria às famílias pagar dívidas, poupar, ou consumir. A economia agradeceria. O governo tinha dito que não vinha aí um novo pacote de austeridade. Uma das curiosidades da apresentação do orçamento de estado, ontem, era saber com que inventividade semântica conseguiria o governo não se desmentir, uma vez que para atingir as metas previstas em austeridade seria necessário fazer cortes de cerca de quatro mil milhões de euros, 20% acima do que antes estava anunciado. A resposta foi dada ontem pela Ministra das Finanças: impossibilitada a redefinição do significado da palavra “austeridade” e evitada a redefinição do significado da palavra “pacote”, Maria Luís Albuquerque explicou que a chave estava na palavra “novo”. É que, vejam bem, este não é um novo pacote de austeridade, este é “o mesmo” pacote de austeridade. Neste contexto, “novo” deixou de querer dizer “aplicado pela primeira vez” e “o mesmo” passou a querer dizer “algo que já tínhamos anunciado portanto é como se já tivesse acontecido”. Um pouco depois, o porta-voz do PSD insistiu que este era “o mesmo” pacote porque as suas medidas já tinham sido anunciadas pelo primeiro-ministro no mês de maio, apesar de algumas das medidas anunciadas não estarem no pacote, e estarem no pacote algumas que não foram anunciadas, este pacote não é novo, é o mesmo, é algo que já foi, apesar de ainda ir acontecer. Basta. Basta destes pantomineiros orçamentais.

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Aung San Suu Kyi recebe o Prémio Sakharov

Nesta terça-feira Aung San Suu Kyi recebeu o Prémio Sakharov que lhe foi atribuído em 1990 pelo Parlamento Europeu. Por ter estado em prisão domiciliária, a líder da oposição birmanesa não pode recebê-lo há 23 anos. As coisas mudam. Vale a pena lutar. Aung San Suu Kyi começou o seu discurso dizendo que aquele era um momento alegre e significativo. Agradeceu o apoio do PE. Depois improvisou, brincou, falou de livros e do cheiro deles, homenageou Sakharov e falou da liberdade de pensamento. “A liberdade de pensamento começa com o direito a fazer perguntas”, disse ela. Sobre a democracia, afirmou: “Eu nunca aleguei que a democracia fosse perfeita. Mas não existe algo de agradável e estimulante na imperfeição?”.

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Novas regras de protecção de dados aprovadas por deputados europeus

Vi o Jan Philipp Albrecht trabalhar na nova legislação de proteção de dados durante o último ano e meio, e antes disso fomos sempre aliados (ainda antes de estarmos no mesmo grupo) no combate aos abusos de estados e companhias privadas sobre a privacidade de cidadãos e indivíduos. Levei-o a Lisboa em setembro de 2011 para explicar o que pretendia fazer enquanto relator do acordo-quadro de proteção de dados com os EUA (que estes têm bloqueado até agora). Como somos vizinhos de gabinete vi quando ele e os seus assistentes receberam cerca de cinco mil emendas ao relatório que tinham apresentado (muitas delas com origem nos lóbis das grandes empresas da internet). E agora, depois de todo o trabalho, cumpre-me felicitar o Jan Philipp pelas muitas boas ideias: proibição de reenvios de empresas às autoridade de países terceiros (ex.: os EUA) sem autorização de autoridades europeias, multas que doem às empresas que prevariquem, direito a que sejam apagados todos os nossos dados a nosso pedido (“direito a ser esquecido”). Só amanhã, com mais vagar, poderei verificar se passou a minha emenda, cuja intenção é criar um sistema de símbolos simplificado para resumir as extensíssimas e ilegíveis “políticas de privacidade” dos sítios e serviços de internet. Mas hoje vale um abraço de parabéns! Agora, é claro, recomeça outra vez o trabalho: é preciso votar em plenária, e (o mais difícil) fazer passar estas ideias pelo Conselho, e depois nos trílogos entre Parlamento, Comissão e Conselho. Mas fiquem sabendo que no parlamento há gente que trabalha muito por nós todos, que os representantes também são cidadãos, e que o progresso é possível, mas não acontece sem muito muito esforço. Job well done, Jan Philipp Albrecht! Congratulations! Novas regras de protecção de dados aprovadas por deputados europeus

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O arco constitucional

Não sendo a Constituição um mero repositório de princípios congelados a defender, um arco constitucional deveria também esforçar-se para criar as condições políticas para que se cumpram os desideratos da Constituição. Ou seja, não apenas defender (por exemplo) os princípios da universalidade e da igualdade, mas promovê-los. O cerco vai apertando. É Pedro Passos Coelho que, a cada intervenção, responsabiliza o Tribunal Constitucional no caso de “o país falhar”, ou seja, se ele falhar. São os seus correligionários que, em entrevistas, culpam a Constituição da República Portuguesa pelos entraves à austeridade sem entraves. É Durão Barroso que, em clara transgressão ao artigo 4º do Tratado da União Europeia — dever de respeitar as constituições dos estados-membros, estando estas em conformidade com os valores do respeito pela dignidade humana, a democracia, a liberdade, a igualdade, o estado de direito e o respeito pelos direitos humanos, incluindo os das pessoas oriundas de minorias —, lança alertas para a necessidade de não haver mais surpresas vindas do Palácio Ratton. É o FMI pela voz da sua diretora Christine Lagarde, considerando o Constitucionalportuguês um “tribunal ativista” (pergunto-me por que não diz ela o mesmo do Tribunal Constitucional Alemão, que praticamente parou todo o processo europeu com a sua decisão sobre o Tratado de Lisboa). E são, finalmente, todos os pedidores de consensos, do Largo do Caldas ao Palácio de Belém, que desejam amarrar o Partido Socialista a um acordo que desse a requerida maioria de dois terços necessária para passar um verniz constitucional por cima de novos cortes, a coberto da necessidade de entendimentos entre o “arco governativo”. Chegou aqui e parou.

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Ingerência da CE nos assuntos nacionais de um Estado-membro

Em tempos é que uma representação da Comissão Europeia se permite chantagear o Tribunal Constitucional português é preciso reagir rápido e com espírito de união. Foi assim que a minha colega Edite Estrela e eu enviámos há pouco esta pergunta escrita à Comissão exigindo justificações para esta bizarra atitude, em desrespeito pelos próprios da União. Obrigado à Edite pela pronta resposta e cooperação. Em futuras reações a este caso que deve preocupar todos os cidadãos portugueses e europeus que defendam o estado de direito abriremos certamente a todos os outros deputados portugueses no PE.

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