Há duas maneiras de lidar com a pressão cidadã por mais democracia. Uma é fechar os olhos ou menosprezá-la, considerando-a uma mera expressão de experimentalismo ou uma intromissão irritante na esfera dos auto-consagrados políticos experientes. Outra é entendê-la e fazer de forma a que ela se materialize preservando todos os outros valores do estado de direito e do sistema de direitos fundamentais. Graças a uma espécie de decisão coletiva tomada em Portugal no dia 1 de dezembro de 1640 — que, fiel ao seu estilo, o atual governo aboliu como feriado — nós portugueses não temos de nos preocupar com a encruzilhada em que a abdicação do rei Juan Carlos deixou os espanhóis: sucessão ou referendo? monarquia ou república?Não é isso que impede, porém, de compartilhar o entusiasmo com que os nossos vizinhos vivem estes dias. Há uns vinte anos, isto seria impensável: qualquer espanhol nos diria que a monarquia fazia parte do compromisso histórico que permitira o estabelecimento da democracia em Espanha e que era, por isso, intocável.O que sucedeu?