Sempre estranhei que se pudesse tentar mobilizar gente com discurso apocalíptico: o planeta vai acabar, a democracia vai acabar, o estado social vai acabar. Não que, a manterem-se as tendências atuais, tudo isto nãopossa ser verdade. O problema está na diferença de escala entre cada um de nós e o conjunto das restantes coisas. Nós duramos pouco tempo; o planeta estava aqui antes de nós e ficará talvez para depois. A nossa história parece insignificante quando comparada com a História a que teimosamente pomos uma maiúscula para ficar maior ainda. Algumas pessoas podem angustiar-se com o resultado final. Para a maioria, parece que contamos demasiado pouco, quase nada, para podermos fazer a diferença. E passa-se o mesmo quando passamos para a escala intermédia. Nós somos pequenos, a crise é grande. Se nos parece que a economia está contra nós e o caos do país é demasiado grande para organizar, a reaçãonatural é de desistência. Que poderíamos nós fazer? A mudança parece demasiado difícil, demasiado longínqua, demasiado complexa, demasiado arriscada para que a tentemos sequer. Se o fim está próximo, já não dá tempo, já não vale a pena, já não conseguimos. Uns deprimem, outros desistem, outros vão cuidar da vida.