O que a AR deve fazer para nunca esquecer o combate à violência doméstica [texto integral]

|Do arquivo Público 01.11.2017| Eis uma coisa que aprendi com o parlamento da Catalunha, e que não tem nada que ver com a questão da independência. No princípio do mês liguei-me ao sítio do Parlament para assistir em direto a uma declaração sobre os resultados do referendo de 1 de outubro. Para minha surpresa a presidente do parlamento, Carme Forcadell, iniciou a sessão dando informações atualizadas sobre o estado de duas mulheres vítimas de violência doméstica, uma das quais tinha falecido. De seguida, atualizou os números de vítimas mortais de violência doméstica na Catalunha. E só depois deu a palavra ao presidente da Generalitat para que se pronunciasse sobre o assunto do momento. Nem a esperada (e logo suspensa) declaração de independência alterou o dever de memória perante as vítimas da violência doméstica. Aquele ato — que presumo pouca gente tenha visto — foi um soco no estômago. Não sei se é uma obrigação regimental do parlamento catalão. Mas sei qual é a intenção do ato: obrigar os legisladores a encararem a realidade brutal da violência doméstica. Obrigar os representantes dos cidadãos a nunca esquecerem as vítimas. Obrigar a instituição máxima de uma democracia a nunca retirar o combate a este crime do topo das suas obrigações. Isto vale para o Parlamento da Catalunha como vale para qualquer outro parlamento, seja ele autonómico ou nacional. E eu defendo que deve valer para o Parlamento português. Portugal não é o único país no qual a cultura adquirida desculpabiliza,

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Portugal hoje: patriotismo de teclado

A minha crónica de hoje no Público. “Querem fazer do Panteão sacrossanto? Muito bem. Então lembrem-se que este é o país cuja Assembleia da República aprovou a trasladação de Eusébio para o Panteão um ano após o seu falecimento, mas que ainda não conseguiu para lá levar Aristides de Sousa Mendes quase oitenta anos depois de ele ter salvado milhares de vidas na IIª Guerra Mundial. Mais: este é o país no qual, se acontecesse a desventura de falecer Cristiano Ronaldo, a AR teria em toda a coerência de levar o CR7 para o Panteão ainda antes de lá pôr um “justo entre as nações” como Aristides. E repetir-se-ia para muitos dos escandalizados de hoje o aplauso geral com que não falharam ontem. Querem respeitar o simbolismo dos monumentos nacionais? Muito bem. Reparem então, de cada vez que passarem pela Praça do Comércio, espaço central da nossa simbólica de Estado, que a República mais visível que lá encontrarão é a República… da Cerveja. Reparem que um pedaço da mesma praça está ocupado por uma coisa chamada o “WC mais sexy do mundo”, concessionado para permanente propaganda de uma marca de papel higiénico (é ao lado do Ministério das Finanças; paga-se 50 cêntimos para usar os urinóis e passam fatura com número de contribuinte, portanto deve estar tudo certo). Isto nunca escandalizou ninguém em Portugal. Perguntem-se se o mesmo aconteceria na Praça de São Pedro, no Louvre ou no Kremlin.”

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O que a AR deve fazer para nunca esquecer o combate à violência doméstica.

“Dir-se-á que abrir cada sessão plenária da AR com a informação atualizada dos crimes de violência doméstica será uma estratégia de choque. Dir-se-á que lembrar as mulheres assassinadas antes de cada debate quinzenal com o primeiro-ministro será um gesto brutal. Sim, será brutal. Será também necessário. Enquanto a cultura predominante — até no judiciário — continua a ser a de afastar o problema da vista, enquanto até um ex-ministro da cultura é condenado — com pena suspensa — por violência doméstica, o país precisará de reforçar as formas de encarar a sua realidade. O país político, representado pelo parlamento e o governo, não poderão mais esquecer a sua obrigação de agir. O estado não poderá mais desviar o olhar de todas as mulheres agredidas e assassinadas em casos de violência doméstica em Portugal.” Podem ler o texto completo no Público de hoje.

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Temo que não aprendamos à segunda tragédia: é preciso um Plano Marshall para o interior

“Após a catástrofe nacional de passado dia 15, é obrigatório discutir um Plano Marshall — a referência é batida, mas entende-se rapidamente o que quero dizer — para o interior do país e para as zonas afetadas. Discuta-se a proteção civil, sim. Mas se não se discutir já a recuperação económica e social corremos o risco de abandonar estes portugueses uma vez mais. Se não discutirmos já a valorização das pessoas e do território, não estaremos a fazer justiça às vítimas. Porquê? Porque é urgente e porque é possível: o Orçamento de Estado para 2018 acabou de dar entrada no parlamento. Eu respeito o partido que — ao invés de aproveitar o momento para marcar pontos mediáticos — diga o seguinte: “estamos dispostos a sentar-nos à mesa do orçamento para o alterar na especialidade tendo em conta a nova situação no interior do país, e estamos dispostos a fazê-lo mesmo que isso signifique que algumas das boas notícias do orçamento não possam agora ser tão generosas como antes se pensava”. É impensável que este orçamento possa ser aprovado sem um plano substancial e decisivo para a recuperação do interior e das zonas de catástrofe, que nos permita depois pedir também a ajuda da UE para um novo pacote do Fundo de Desenvolvimento Regional dedicado à reconversão da floresta portuguesa. Ou há solidariedade entre portugueses ou não teremos moral para exigir solidariedade aos outros.” Excerto da minha crónica de hoje no Público.

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Recibos verdes, o ponto cego do orçamento

A minha crónica de hoje no Público é sobre os recibos verdes no OE 2018. Um breve excerto: “Os contribuintes categoria B são mais conhecidos como “os recibos verdes”. Tanto podem ser os famosos “falsos recibos verdes” como os verdadeiros “trabalhadores independentes”. Todos eles deram um pulo na cadeira quando na sexta à meia-noite foi apresentado o orçamento e começaram a aparecer nas TVs tabelas em que — ao contrário do que se passava com trabalhadores por conta de outrem com rendimentos semelhantes — os seus impostos sofriam em 2018 um enorme aumento, que poderia ir dos 16% aos 25%. Sem informação prévia, os portugueses que vivem no mundo já por vezes kafkiano dos recibos verdes ficaram sem saber se estavam a ver a vida andar para trás, se o problema era do orçamento, de uma má interpretação jornalística ou de contas mal feitas pelos consultores fiscais de que a imprensa se socorre nestas ocasiões. Passado um par de dias, é ainda perplexos e alarmados que estão.”

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Podemos passar pelo “caso Sócrates” sem tirar lições?

Podemos passar pelo “caso Sócrates” sem tirar lições? “De facto, mesmo que o que sabemos das quatro mil páginas não tenha sido verdade mas seja apenas plausível, demasiadas coisas estão por fazer, porque demasiadas coisas terão possivelmente falhado. Os nossos governantes não foram suficientes escrutinados nem fiscalizados. Os conselhos de administração de empresas públicas não foram suficientes independentes nem transparentes. As pessoas que poderiam ter identificado irregularidades ou comportamentos suspeitos não estavam suficientemente protegidas para poderem denunciar em segurança. E a nossa democracia — na qual , lembre-se, alguns dos nossos concidadãos reelegeram há menos de duas semanas um autarca condenado — não está suficientemente protegida para que o dinheiro obtido criminosamente não venha no futuro a comprar poder político, mesmo no topo da hierarquia.” Hoje no Público e a crónica completa pode ser lida aqui.

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A questão catalã é para levar a sério [texto integral]

|Do arquivo Público 11.09.2017| Hoje, 11 de setembro, é previsível que centenas de milhares de catalães saiam às ruas como fazem todos os anos na jornada a que chamam “Diada”. Trata-se da comemoração de uma derrota: aquela que, em 1714, encerrou por séculos a questão da independência da Catalunha, no fim da Guerra da Sucessão espanhola.  O que poucos portugueses sabem é que essa data marca também o fim da intervenção de Portugal nas questões nacionais de Espanha. Sim, nessa guerra em que Portugal participou aliado à Áustria (que apoiava, na prática, a secessão da Catalunha), à Holanda e a Inglaterra, contra a França e a Espanha, tropas portuguesas chegaram a ocupar Madrid em 1707 e a coroa portuguesa revelava pretensões sobre a Galiza e a Extremadura espanhola. O Tratado de Utrecht, de 1713, saldou-se por uma espécie de empate: o rei de Espanha viu-se forçado a reconhecer o rei de Portugal como seu igual e a aceitar definitivamente a independência portuguesa; pelo seu lado, Portugal abandonou pretensões a terras espanholas no continente europeu (na América do Sul a história foi diferente; e mesmo na Europa a história inverteu-se cem anos depois, quando os espanhóis se aliaram a Napoleão em troca de metade de Portugal e acabaram a “esquecer-se” de devolver Olivença após o Congresso de Viena). A decisão, por parte do Estado português,

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E se não tivéssemos desperdiçado as autárquicas?

A minha crónica de hoje é sobre estas eleições autárquicas. Aproveito para lembrar: não percam a oportunidade de votar no próximo domingo. Deixo abaixo um excerto do texto no Público. “Nas autárquicas de há quatro anos, a notícia da noite foi a ultrapassagem de uma fasquia pelos movimentos independentes: com a vitória de Rui Moreira, apoiado pelo CDS mas à cabeça de uma lista apartidária, os independentes passavam a governar a segunda cidade do país. Lisboa já era então governada por uma confluência entre partidos e movimentos de cidadãos independentes, a partir do momento em que António Costa, e agora Fernando Medina, estabeleceram um compromisso para a capital com Helena Roseta do movimento Cidadãos por Lisboa e José Sá Fernandes, da associação Lisboa é Muita Gente (declaração de interesses: o LIVRE juntou-se este ano a essa candidatura, que também apoio pessoalmente). Se Portugal valorizasse mais as inovações políticas que trazem qualidade à democracia, talvez se tivesse notado que o nosso país foi pioneiro em soluções políticas locais, à esquerda ou à direita, que aqui parecem só ser notícia quando acontecem em Madrid, Barcelona, ou para lá dos Pirinéus. Mas nas eleições autárquicas do próximo domingo, o que será notícia?”

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O estilo apocalíptico na direita portuguesa [texto integral]

|Do arquivo Público 06.09.2017| No fim do seu discurso aos jovens sociais-democratas, Cavaco Silva deixou um recado que não está a merecer a devida atenção. Disse ele:  “De vós jovens eu espero que não vos falte a força e a coragem para combaterem o regresso da censura. Se tiverem oportunidade não deixem de ler um artigo excelente, muito bem escrito, de Maria João Avillez, publicado na passada segunda-feira. E fico por aqui. Não vos quero maçar mais.” Estranhei. Como remate de discurso, é das coisas mais bizarras que já me foi dada ouvir. Mas depois fui ler o artigo de Maria JoãoAvillez recomendado por Cavaco Silva (trata-se de “O meu mundo não é deste reino”, no Observador de 28 de agosto). Aconselho a sua leitura a toda a gente. Trata-se igualmente de um texto alusivo. A autora começa por descrever uma ameaça, que lá por ser vaga não deixa de ser menos assustadora: “Vigiam-nos. Estão atentos. Estão de serviço. Mobilizados pelo pensamento único, uma nova forma de vida. Nunca se cansam.” De pelos eriçados, em vão nos perguntamos: quem?

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Que ganhamos em ignorar Macron?

Que ganhamos em ignorar Macron? – A minha crónica de hoje no Público. “Sendo assim, quem saberá que ontem passaram a ser propostas oficiais da França as ideias que passo a listar? Criação de um imposto sobre o carbono emitido na UE e de uma taxa sobre o carbono nas importações para financiar a transição ecológica; apoio à taxa para sobre as transações financeiras para capitalizar a ajuda ao desenvolvimento e as políticas de integração de refugiados; criação de uma força europeia de proteção civil contra as catástrofes naturais; aprovação de uma doutrina europeia de defesa; harmonização dos impostos sobre os lucros das empresas; estabelecimento de regras para um salário mínimo europeu, adaptado à realidade nacional; criar uma agência europeia do digital e tributação dos gigantes da internet; eleições europeias com um segundo boletim de voto para listas pan-europeias de candidatos (no lugar dos 73 eurodeputados britânicos que saem). E poderíamos continuar. Haverá aqui propostas boas, más, excelentes e péssimas. Ideias vagas ou impossíveis de concretizar. O que não pode haver é pretextos para ignorar que estas propostas estão agora em cima da mesa e que devem ser discutidas, apoiadas umas, combatidas outras.”

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