Os cartazes de Manuel Alegre nas ruas, há cinco anos, tinham apenas as palavras “Livre, justo, fraterno” — a descrição idealizada do país, tal como aparece desejada no preâmbulo da Constituição — redigido pelo próprio Manuel Alegre.
Esta escolha era puro Manuel Alegre. Pelo gosto de palavras que eram belas, mas não apenas isso; concretas e mobilizadores. E sobretudo por que nenhum marqueteiro, nenhum diretor de campanha, o aconselharia jamais a fazer um cartaz assim, tão desformatado dos códigos publicitários. Manuel Alegre acreditava na palavra livre, na palavra justo, e na palavra fraterno — não um acreditar de fé, mas um acreditar de conhecer aquelas palavras por dentro e saber o que elas podem fazer.
Teimosamente, insistiu. Teve vinte por cento.
A primeira palavra, livre. Alegre viveu-a quando era difícil — na ditadura que os melhores do seu tempo combateram. Mas não a esqueceu quando teria sido fácil — na democracia, quando teria sido fácil institucionalizar-se e acomodar-se. Ao insistir na sua liberdade exasperava partidos, governos e líderes — principalmente os seus — e deliciava cidadãos. Mesmo quando não se concordam com Manuel Alegre, as pessoas respeitam Manuel Alegre. A liberdade dele também nos faz mais livres a nós.
A segunda palavra, justo, dirige-se à grande maldição nacional. Este é um país desigual, difícil, que desanima os mais fracos, e depois nos desilude a todos. Há mais do que uma maneira de ver esta injustiça: como sintoma ou como causa. Os que defendem que a injustiça é um mero sintoma acham que podem sempre adiar o problema para depois do crescimento, e para depois do défice, e para finalmente nunca. Mas a injustiça é a causa do nosso atraso — ela é, na verdade, o nosso atraso.
Uma sociedade com oportunidades mais bem repartidas encontra mais soluções para os seus problemas, incluindo para os problemas individuais, porque as encontra junta. Esse é, talvez, o significado da terceira palavra — fraterno.
Cada uma destas palavras é, como vemos, muito mais do que apenas uma palavra. E feliz seria Portugal se pudesse ser nada mais que estas palavras.
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Já muitas vezes votei no candidato menos mau, e não me envergonho disso. Mas desta vez tenho a sorte de votar num candidato de quem gosto — tendo-o visto apenas uma vez e não trocado mais que uma tímida palavra com ele — e por quem sinto verdadeira admiração.
Acrescento três coisas que me fazem apreciar mais ainda Manuel Alegre.
Uma, que perante incompreensões de parte a parte, não desiste de fazer pontes entre os partidos desavindos da esquerda portuguesa. O povo de esquerda, mais sensato que os seus dirigentes, agradece-lhe.
A segunda, que é o único candidato a ter uma visão exigente da Europa. Uma visão construtiva, idealista até, mas consciente de que a Europa como está agora é uma irresponsabilidade.
A terceira, que tem idiossincrasias. Fulano não gosta de Alegre pela caça, o outro pela poesia. Para um ele é de esquerda a mais, para outro muito centrista, para outro ainda tem laivos de conservador. Alegre respeita isso tudo, e ao mesmo tempo não liga nada a isso, limitando-se a ser como é (só vejo outro político português assim; ironicamente, é Mário Soares).
Era de Manuel Alegre a voz que deu esperança aos meus pais durante a ditadura. E eram de Manuel Alegre as palavras que no preâmbulo da Constituição começaram o desenho de um país democrático. Espero que tenhamos a voz e as palavras de Manuel Alegre durante muito tempo, chegando muito longe, — e como Presidente da República.