O sistema partidário português está doente. O voto da semana passada sobre a co-adoção limitou-se a reforçar este diagnóstico.

Há uns anos em Moscovo, fiquei a saber que quem chega atrasado a um encontro deve pagar três copos de vodka a quem foi obrigado a esperar. Chegando atrasado às notícias da semana passada, divido a crónica de hoje em trêsbreves.

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A troika é, sim, ilegal. De várias formas: porque não teve base legal para a sua formação, porque se arrogou de poderes de decisão que ninguém lhe poderia ter dado, porque atropelou direitos e legitimidades nos países onde estabeleceu a sua jurisdição.

Acima de tudo, a troika estava contaminada por um pecado original, um conflito de interesses insanável. As suas duas instituições comunitárias — a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu — deveriam, no respeito pelos tratados, estavam obrigadas ao princípio da igualdade entre estados-membros. Mas estiveram cá, na Grécia, na Irlanda, e em Chipre, como representantes dos países credores e cobradores de dívidas numa relação assimétrica.

O relatório votado na semana passada no Parlamento Europeu não diz tudo o que nós portugueses gostaríamos de ouvir. Mas diz o essencial para que os danos possam um dia ser compensados, incluindo que a legalidade da troika e das suas decisões pode um dia ser levada ao Tribunal de Justiça da União Europeia. E, porque não? Se o Mecanismo Europeu de Estabilidade ou as Transações Monetárias Diretas (OMTs) foram levados ao tribunal Constitucional alemão, por que não poderão os estados-membros, ou o Parlamento Europeu, fazer valer os seus direitos e dos cidadãos que devem defender e representar?

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O sistema partidário português está doente. O voto da semana passada sobre a co-adoção limitou-se a reforçar este diagnóstico. Mais uma vez as direções partidárias (no caso, as dos partidos da direita) enveredaram por uma mal disfarçada e inconstitucional pressão sobre os seus deputados para que estes se conformassem às suas conveniências políticas. Desde a “orientação de voto firme” do CDS/PP às mudanças de última hora dos deputados do PSD, tudo aquilo tresandou a chantagem das direções sobre os deputados. A política da representação por convite é nisto que dá. E nenhum partido está isento: ainda toda a gente se lembra de como Seguro torceu braços para garantir a aprovação do Tratado Orçamental, ao passo que nos partidos mais à esquerda a clonagem de comportamentos políticos foi já elevada a forma de arte.

Uma tomada de posição corajosa dos deputados, em defesa da supremacia do parlamento sobre as direções partidárias, permitiria corrigir esta disfunção do nosso sistema político. Enquanto isso não acontecer, as vítimas continuarão a ser os mais fracos: desta vez, as crianças cujas famílias não são iguais às das preferências conservadoras.

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Hoje entramos numa nova velha era da nossa história: o período de entre-guerras na Europa, onde pretextos, minorias e pseudo-referendos eram usados para que líderes políticos autoritários pudessem aumentar as fronteiras dos seus países pela força. A Rússia, membro permanente do Conselho de Segurança e um país grande pela sua história, cultura e dimensões, não precisa disto — só Putin precisa. Três copos de vodka para a Europa!

(Crónica publicada no jornal Público em 17 de Março de 2014)

2 thoughts to “Três para o caminho

  • olhe que não garoto olhe que não

    1ª o facto de se perderem meses a discutir assuntos que abramgem franjas muy limitadas da populaça

    e ninguém se importa com o pessoal que dorme na rua ou nas barracas há anos

    nem ninguém se importou com as lojas detidas por bancos que estão fechadas há mais de 30 anos

    pelos processos litigiosos que mantém coisas em armazém durante 20 anos e os trabalhadores nada recebem

    há aqui lojas de electrodomésticos que faliram em 1983 a juros de mora de 20 e tal por cento ao ano
    e 31 depois continuam fechadas os empregados já morreram todos ou têm 78 anos e estão em lares da misericórdia

    e desde que foram despedidos há 31 anos com 58 ou 47 anos nunca mais arranjaram emprego numa cidade onde fora da câmarae ou dos serviços estatais e da indústria vestigial não há emprego

    numa cidade onde Emídio Catum e amigos desde os anos 90 construiram dezenas de milhares de fogos quando havia mais de 8000 fogos desocupados desde o fim do boom da construção civil em 1974

    logo partidos que só discutem merdas

    e se manifestam em manifestos pelos direitos de uns poucos

    que não são nada para a miséria de milhões que sobrevivem à míngua ou emigram sazonalmente desde os anos 80

    os direitos das minorias são muito bonitos

    mas as maiorias também gostavam de ter alguns

    pergunta lá ao velho de 78 anos sem emprego de jeito desde 1983
    que dorme na rua há 20 anos ou no lar da misericórdia quando calha onde estão os direitos dele desde 1983

    não lhe descontaram nada desde os 12 anos que trabalhava na fábrica de farinha de peixe que por acaso ardeu esta semana
    foi saneado em 1975 por andar em cima duma em quem o sindicalismo também se queria por

    saneado aos 40 anos de idade com 28 anos de serviço a carregar sacas de farinha de peixe agulha
    8 anos a trabalhar numa loja que faliu em 1983 com 6 meses de salário em atraso

    as finanças penhoraram-lhe a casa a 91 por falta de pagamento das contribuições
    era um buraco no meio da serra com 900 metros quadrados de terreno
    com meia dúzia de árvores e uma horta de merda

    desde 1992 que dorme nos matos e pastava ocasionalmente um ou outro rebanho

    não tem filhos não tem casa nem sei se ainda sabe receber os 174 euros de reforma
    ispilica lá onde estão os direitos de 18 mil velhotes da indústria da sardinha enlatada e da farinha de peixe agulha dos viveiros de ostras que se foram nos anos de 79 e 81 da amêijoa da frota de traineiras e de barcos que faziam o trânsito entre as penínsulas divididas pelo rio

    o pessoal reformado das minas o pessoal dos estaleiros navais de barquinhos de madeira que desde 1988 foram para a rua

    onde estão os direitos destas gentes
    há um milhão e meio deles a menos de 250 euros por mês

    e limparam camas a turistas da torralta a 25$ por dia durante anos
    e cuspiram os pulmões nas pirites
    e cortaram as mãos nas redes

    e os direitos deles ahn?

    olha há um das minas de aljustrel que morreu há 6 anos e o hospital inda lhe manda o custo das análises que ficaram por pagar
    era rico tinha 585 euros de reforma
    e tinha direito a duas consultas por ano com raios x obrigatórios
    pra ajudar os pulmões a ficarem melhorzinhos

    os direitos dele eram duas chapas de 6 em 6 meses para quê
    bom o pessoal precisa de ganhar algum à custa da miséria dos outros

    receitavam-lhe uma carrada de anti-inflamatórios e obviamente os bóptimos comprimidos para retirar toda a dor e abrire um buraco no estômago pró receitar omeprazol

    logo miséria e quem vive dela há muita por aqui desde 1974 e antes disso

    e nunca ninguém se interessou por isso
    nem na ditadura e ainda menos durante a democracia

    logo pôrra ide todos à merda e sêde felizes

  • olhe que não garoto olhe que não

    num país onde os vendedores ambulantes e muitos pequenos negócios colectados nas finanças não ganham o suficiente para pagarem as corveias estataes e preferem ser multados pelos fiscais ou arrebanhados pela ASAE a continuarem a ser colectados

    onde as câmaras perseguem os poucos logistas que ainda existem com catrefadas de regulamentos

    não admira que haja 30 mil espaços comercias fechados há décadas numa península que nem um milhão de habitantes tem

    desde croissanterias falidas no fim dos anos 80 a clubes de vídeo falidos nos anos 90 há milhares delas de Almada a ALCÁCER DO sal
    passando pelo Barreiro até vendas novas onde as fábricas e as lojas fecharam desde os anos 70 aos 90 e hoje só restam empresas municipais e instituições estatais ou camarárias
    e agências de bancos e cafés

    logo em 40 anos acho que os partidos todos deveriam ter olhado para outras merdas

    Prós Institutos dos doutores como o Miguel Mota reformado de luxo aos 92 se ainda continuar vivo desde o mês passado né

    ou já foram dois meses?
    aqui dos 54 aos 102 morreram 9 este mês todos juntos não faziam por mês metade da reforma do senhor professor
    estão todos no talhão do fundo
    o crematório inda não funciona
    só há um na quinta do conde
    em 40 anos podiam ter feito um já há uns anos…dava jeito morrem mil todos os anos bom 900 e tal

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