by Karien Deroo

Pois é: se não existisse, este governo teria de ser inventado. Só não precisava de ter sido inventado para nós. E, pior ainda, por nós.

Se não existisse, este governo teria de ser inventado. Só este governo conseguiria ser apanhado a pedir desculpas agenerais angolanos enquanto rouba velhinhas em Portugal. Nem nos filmes.

O pedido de desculpas aos generais angolanos tem sido entendido como uma caturrice de um político destreinado como o Ministro dos Negócios Estrangeiros. Que nada. Pelo que me é dado entender, o Ministro dos Negócios Estrangeiros não tem nada de destreinado, e neste particular limita-se a seguir a política do seu antecessor, Paulo Portas, que consistia em ativamente lamber as botas de qualquer oligarca estrangeiro que queira investir dinheiro em Portugal. Não há nada de subtil nem sofisticado nessa política.

Um dos elementos centrais desta política chama-se Visto Dourado, o que até rima com Apito Dourado. E funciona assim: se você for cidadão estrangeiro, e tiver meio milhão de euros para “investir” em Portugal, o governo dá-lhe um visto hiper-rápido e com super-poderes, com possibilidade de chegar mais depressa à nacionalidade portuguesa. Detalhe: não perguntamos de onde vem o dinheiro. Se você for cidadão estrangeiro, e tiver trabalhado no duro durante anos, pagando impostos portugueses, segurança social portuguesa, ou fazendo estudos em Portugal, ponha-se na fila e espere pacientemente.

Segundo uma fonte oficial do Ministério dos Negócios Estrangeiros, até ao passado 29 de setembro, os vistos dourados foram abarbatados principalmente por russos, chineses e angolanos, que investiram um mínimo de meio milhão de euros, por exemplo, em imobiliário. Também um guineense: imagine-se, num país de população paupérrima, mas unanimemente considerado como um paraíso para o narcotráfico, de onde vem o dinheiro de um guineense disposto a investir mais de meio milhão de euros em Portugal.

Se é legal? Claro que é legal. Foi feito pela mesma maioria que faz as leis!

(Claro, sabe-se que a compra de imobiliário em Portugal, usando para tal veículos financeiros registados, por exemplo, nos Emirados Árabaes Unidos, é um mecanismo típico da lavagem de dinheiro que ocorre diariamente entre alguns destes países e o nosso. Também se sabe que os nossos parceiros do espaço Schengen reagem a qualquer irregularidade na atribuição de passaportes, e que fecham as fronteiras ao mínimo influxo de refugiados. Mas aceitam alegremente os depósitos dos ditadores dos países de cuja miséria recusam os refugiados. Há dias em que esta hipocrisia cansa demasiado.)

Em suma, a política de cócoras perante qualquer oligarca disposto a lavar o seu dinheiro em Portugal nasceu com Paulo Portas. O mesmo Paulo Portas que, agora como vice-Primeiro Ministro, avaliza o corte nas pensões de sobrevivência. Pedro Mota Soares, ministro do mesmo partido, vai sugerindo que o corte é apenas para os pensionistas que “acumulam” pensões, mais uma vez provando que este governo precisa sempre de lançar um anátema sobre as suas vítimas. Estes terríveis acumuladores de pensões são, por exemplo, pessoas que detêm uma pensão mínima, e que após a morte do cônjuge de décadas, dependem da pensão de sobrevivência (já por si metade da pensão do cônjuge falecido) para fazerem a diferença entre uma vida remediada e a miséria.

Pois é: se não existisse, este governo teria de ser inventado. Só não precisava de ter sido inventado para nós. E, pior ainda, por nós.

(Crónica publicada no jornal Público em 09 de Outubro de 2013)

2 thoughts to “Generais contra viúvas

  • alexandre

    A aplicar também no Palamento Europeu:

    “Lei de Reforma do Assembleia (proposta de emenda à Constituição)

    1. O deputado será assalariado somente durante o mandato. Não haverá ‘reforma pelo tempo de deputado’, mas contará o prazo de mandato exercido para agregar ao seu tempo de serviço junto ao INSS referente ao seu trabalho como cidadão normal.
    2 A Assembleia (deputados e funcionários) contribui para o INSS. Toda a contribuição (passada, presente e futura) para o fundo actual de reforma da Assembleia passará para o regime do INSS imediatamente. Os senhores deputados participarão dos benefícios dentro do regime do INSS, exactamente como todos outros portugueses. O fundo de reforma não pode ser usado para qualquer outra finalidade.

    3. Os senhores deputados e assessores devem pagar os seus planos de reforma, assim como todos os outros portugueses.

    4 Aos deputados fica vedado aumentar os seus próprios salários e gratificações fora dos padrões do crescimento de salários da população em geral, no mesmo período.

    5. Os deputados e seus agregados perdem os seus actuais seguros de saúde, pagos pelos contribuintes, e passam a participar do mesmo sistema de saúde do povo português.

    6. A Assembleia deve igualmente cumprir todas as leis que impõe ao povo português, sem qualquer imunidade que não aquela referente à total liberdade de expressão quando na tribuna da Assembleia.

    7. Exercer um mandato na Assembleia é uma honra, um privilégio e uma responsabilidade, não uma carreira. Os deputados não devem “servir” mais de duas legislaturas consecutivas.

    8. É vedada a actividade de lobista ou de ‘consultor’ quando o objecto tiver qualquer laço com a causa pública. “

  • Júlio

    Rui Tavares, junte-se ao bloqueio do porto de lisboa de 19 de outubro. Estar lá um deputado europeu talvez seja forma de não prenderem toda a gente e de se juntarem mais pessoas …. http://pt.indymedia.org/conteudo/destacada/26703

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