Uma guerra na Europa era, para a França, a oportunidade de ajustar contas com a Alemanha e recuperar as províncias perdidas da Alsácia e da Lorena, uma obsessão não-declarada na qual os nacionalistas deviam “pensar o tempo todo, mas nunca falar”, como sintetizara vinte anos antes o político Léon Gambetta. A França, ou pelo menos uma parte dela, ansiava pela guerra. Mas, por causa do caso Henriette Caillaux, não a viu chegar.

Em 22 março de 1914 uma senhora elegante, com as mãos agasalhadas dentro de um regalo de pele, entrou no gabinete do diretor do jornal “Le Figaro”, um homem chamado Gaston Calmette. “Sabe por que razão estou aqui?”, perguntou ela. “Não faço ideia”, disse ele. E foi aí que ela mostrou uma das mãos, brandindo um revólver. Ele levou seis tiros e já não passou dessa noite. Ela ficou a aguardar julgamento como a ré mais famosa de França.

Acontece que a França estava em campanha eleitoral e ela, Henriette Caillaux, era mulher do mais que provável Primeiro-ministro, Joseph Caillaux, líder do Partido Radical, homem a quem o “Figaro” perseguia publicando as cartas de amor que escrevera à atual mulher quando ainda estava casado com outra.

Uma guerra na Europa era, para a França, a oportunidade de ajustar contas com a Alemanha e recuperar as províncias perdidas da Alsácia e da Lorena, uma obsessão não-declarada na qual os nacionalistas deviam “pensar o tempo todo, mas nunca falar”, como sintetizara vinte anos antes o político Léon Gambetta. A França, ou pelo menos uma parte dela, ansiava pela guerra. Mas, por causa do caso Henriette Caillaux, não a viu chegar.

Quando os jornais franceses souberam que o Arquiduque Francisco Fernando da Áustria-Hungria, e a sua mulher Sofia, tinham sido assassinados em Sarajevo no dia 28 de junho de 1914, as notícias nem chegaram às primeiras páginas. Para a Áustria e para a Rússia, porém, os sinais eram claros. Os dois impérios andavam há anos rivalizando pelos despojos de um outro império, o Otomano, utilizando para tal os seus regimes clientelares nos Balcãs. Nenhum dos três impérios sobreviveria. Mas nenhum o sabia. A Sérvia, de onde tinham saído os assassinos do arquiduque, era protegida da Rússia. A Bósnia, onde se deu o assassinato, era território recentemente anexado pelos Austro-Húngaros.

Um par de semanas depois, em julho, o presidente de França Raymond Poincaré foi em visita oficial a São Petersburgo. Encontrou na corte dos czares a certeza de que a Áustria procurava um pretexto para invadir a Sérvia, provavelmente fazendo uso de um ultimato ostensivamente para investigar o atentado de Sarajevo em território sérvio, mas de condições propositadamente inaceitáveis para criar um pretexto, um casus belli. A Áustria-Hungria assegurara-se de que a Alemanha estaria do seu lado. A Rússia queria saber o mesmo da França. Quando os Austríacos lançaram o seu ultimato, o navio presidencial francês estava de retorno algures nos fiordes noruegueses.

Em Paris, pelo menos um homem tentava evitar a guerra. Era Jean Jaurès, líder do partido socialista (ou melhor, a Secção Francesa da Internacional Operária). De sindicato em sindicato, de clube em clube, pedia aos trabalhadores que fizessem greve geral para não terem de morrer na guerra dos imperadores e dos banqueiros. E hoje, dia 31 de julho, está na redação do seu jornal, “L’Humanité”, para escrever um artigo que fosse a defesa definitiva do pacifismo. Antes, porém, há que jantar. Eles e os seus companheiros saem e escolhem o café “Le Croissant”, na Rue de Montmartre. Jaurès senta-se junto à janela aberta para a rua, à vista dos transeuntes que passam. Um dos transeuntes que passa é um estudante nacionalista chamado Raoul Villain. Tem uma pistola na mão. Dois tiros depois, Jean Jaurès está morto.

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