A política agónica é assim: vai negando a necessidade de abertura e democracia para depois nos assustar com o populismo gerado sob esse estado de negação, e pedir que a salvemos quando ela não foi capaz de se salvar.
As modas italianas, como no passado, voltaram a ser seguidas com rapidez crescente.
Nos passados meses e anos a nossa elite política suspirou por um governo técnico, de sábios, à Monti, para aplicar o consenso das “reformas europeias” — até se verificar a ingratidão com que os eleitores trataram Mario Monti, o senador perpétuo, nas urnas.
Agora, mais rápidos, ainda nem os italianos acabam de formar um governo de largo espectro político, unindo berlusconistas e antiberlusconistas, — e já um congresso do Partido Socialista se afadigou em demonstrar a necessidade de fazer em Portugal um governo que reunisse “democratas cristãos” a “sociais democratas” e genéricos “progressistas”. Para fazer o quê?
Ora, para aplicar o consenso das “reformas europeias”. Qualquer que ele seja, ontem com austeridade mais severa, hoje com austeridade mais piedosa, mas acima de tudo o consenso que então houver.
Não haja dúvidas. O que se passa em Itália é a agonia da política. Dois terços dos italianos votam para enterrar o berlusconismo, apenas para descobrir que o número dois de Berlusconi será o número dois do governo supostamente pós-Berlusconi, e certamente com acordo para, a tempo, legislar para manter Berlusconi fora de apuros. Essencial para esse cozinhado é um partido de centro-esquerda tão despossuído de coluna vertebral que recusou eleger presidente da República um dos seus líderes históricos, Stefano Rodotà, um respeitado defensor dos direitos civis desejado pela maioria dos eleitores da esquerda e do partido de Beppe Grillo, para ir reinstalar na Presidência o mesmo Giorgio Napolitano, de 87 anos, que lá esteve fechando os olhos durante o tempo de Berlusconi.
Em Portugal, o congresso do PS foi uma longa serenata ao mesmo tipo de política, incluindo em surdina os pedidos de namoro ao CDS para que venha a governar com o PS — e quem sabe se o PSD também? — para aplicar a política convencional dos políticos convencionais. No devido momento se esquecerão as críticas a Cavaco Silva, que se demonstrará tão em forma quanto Napolitano para os consensos de largo espectro.
As duas únicas linhas programáticas dissonantes, a de Pedro Nuno Santos preconizando os entendimentos à esquerda e a de João Tiago Silveira promovendo a democracia interna e a abertura do partido, foram sintomaticamente consideradas inoportunas neste momento em que era preciso demonstrar a “unidade” do partido e como ele está “pronto para governar”. E assim 95% dos socialistas lá votaram em António José Seguro, aparentemente com 5% da convicção.
A política agónica é assim: vai negando a necessidade de abertura e democracia para depois nos assustar com o populismo gerado sob esse estado de negação, e pedir que a salvemos quando ela não foi capaz de se salvar.
“Pobres homens práticos! Pobres estadistas!”, lamentava Alexandre Herculano. Têm tanto medo que preferem morrer a mudar os seus hábitos.
(Crónica publicada no jornal Público em 29 de Abril de 2013).
One thought to “A agonia da política”
Expect more of the ones like above.
And they are right.
You are just a part of the ignorant Eurocrats that would like to punish Hungary because it stepped on some corporate interests that control the EU.
Who elected you to tell us how to do our constitution? Neither of us did. Is this really democracy?