E é sempre possível, como diziam os antigos, que o pensamento leve à palavra, a palavra à persuasão, e a persuasão à boa vida e o bom governo. É bom que voltemos a aprender essa verdade.
Há anos que o debate se faz em torno destes pólos: há os que dizem que temos que ficar muito pior, e os que querem resistir a isso para não ficarmos tão mal. Fala-se em “resgatar” do desastre ou em “travar” o desastre, no máximo em “inverter” a tendência. A próxima geração, diz-se, vai viver pior do que esta — ou luta-se para que não perca ao menos as conquistas da geração anterior. Mas por que não se diz, nem se imagina sequer, que ela possa viver muito melhor?
Há os que apregoam que o estado social acabou, e os que falam em salvá-lo — mas nunca em expandi-lo ou melhorá-lo. Há os que querem deter o declínio da Europa, e os que querem apressar o seu fim — mas por que não há quem acredite que este continente de 500 milhões de pessoas que vai de Lisboa a São Petersburgo, possa ter um novo início? Há os que se conformam com a degradação das nossas liberdades, e os que desejam mantê-las — mas por que já não há quem as queira ampliar?
Esta é uma situação bizarra na história da humanidade. Nada neste momento — na tecnologia, no progresso moral e político, ou no estado do conhecimento sobre os recursos naturais e a sua distribuição económica — nos permite dizer que o mundo hoje tenha de ser pior do que antes. A Europa não tem de viver pior porque a América Latina vive melhor, pelo contrário. A China não tem de viver em opressão, quando sabemos que a grandes massas de indivíduos conseguem perfeitamente viver em democracia. Sim, vivemos mais tempo — mas por que será isso insustentável ou pernicioso? Mas por que raios nos convencemos que a luta é entre o pior e o mau, quando podemos perfeitamente estar no limiar do bom e do muito bom?
E em Portugal não é diferente.
Três acontecimentos nacionais deste fim-de-semana sedimentaram em mim esta pergunta. São eles: o discurso de Carvalho da Silva no fim do Congresso Democrático das Alternativas, o discurso de António Costa no 5 de outubro em Lisboa, e a leitura do livro “Primeiras Vontades. A liberdade política em tempos árduos” do filósofo André Barata.
Passo a explicar. O primeiro, a certa altura, dirigiu-se aos jovens e disse-lhes “não acreditem que terão necessariamente de viver pior que as gerações passadas”. Deixar isso entrar na nossa cabeça é o primeiro passo para não querer nem desejar mais. O segundo disse que o “caminho não é o da mão-de-obra barata e desqualificada, da perda constante de rendimento e de direitos — uma lógica do passado que foi um erro colossal”. E acrescentou que o futuro não está aí, mas na ciência, na educação, na criatividade e na cultura. O livro do terceiro, através de uma releitura do grande debate filosófico do século XX, é enfático argumento contra os testamentos e obituários de todo o género a que se dedicam os intelectuais, e pelo regresso a uma “primeira vontade” de expansão da liberdade. A sua primeira frase é “como queremos que seja a nossa história?” e põe as coisas nos termos certos: sim, é-nos lícito querer.
E é sempre possível, como diziam os antigos, que o pensamento leve à palavra, a palavra à persuasão, e a persuasão à boa vida e o bom governo. É bom que voltemos a aprender essa verdade.
8 thoughts to “E por que não muito melhor?”
pois parece-me muito bem, e é óbvio coberto de razão, mas são precisamente estas as áreas, que estão a ser desmanteladas pelo poder, claro haverá de se safar alguma coisa, mas sabemos que sem investimento não haverá nada disto (ciência, educação, criatividae/cultura).
Bom tentemos de novo, o império soviético falhou porque desde a NEP apostou no crescimento continuo e falhou.
É matematicamente impossível num mundo de recursos finitos manter monopólios sem esmagar militarmente ou económicamente os competidores
Nenhuma civilização sobreviveu a crédito e em desvalorizações sucessivas da moeda circulante
Boss mecê pode dourar os denários, cromar os denários, pratear os denários ou piratear os denários
mas isso não impede que uma civilização decadente, que importa sipaios bárbaros e soldadesca dos estados vassalos para manter o domínio imperial
E quando diz que esta geração viverá pior do que a ou as anteriores
isso é completamente falso
Esta geração é a mais educada de sempre, logo em princípio deve conseguir um dia destes descobrir como viver sem trabalhar
A anterior muito menos educada descobriu como trabalhar sem viver durante quase 60 anos de emigração na estranja e 500 anos de emigração brasileira
512 mas quem conta né é só 2 elevado a nove
quando chegarmos aos 1024 viveremos sem fazer puto..
podemos é não viver muito tempo…
e já dizia jorge amado há mais cultura no trapiche do que na ópera de manaus….
passar bem geração empobrecida mentalmente
aposta no eurromilhões quisse passa
ou nisso ou numa impressora de moto continuum
o zimbabué é um exemplo de que viver a crédito resulta
não resulta é para todos…
Caro e Estimado Rui Tavares
Sigo-o com muita atenção e em geral estou sempre concordante consigo.
Este texto, vem mais uma vez comprovar e confirmar o que disse. De facto temos de romper com os “paradigmas” que nos têm inundado o pensamento. Pensar às avessas impõe-se…..se não, resta-nos o “pântano” !
Muito obrigado pelas suas reflexões….um dos seus últimos artigos acerca da unidade da esquerda publicado salvo erro no Público tambem merece aminha total concordância. Aplaudo e conte com este Cidadão para o apoiar nas suas iniciativas na Europa e por Aqui ! Já agora para terminar digo-lhe que adorei a sua intervenção num dos TED não sei se foi em Cascais se em Aveiro. A da folha A4 é magnífico.
Paradigmas, para manter as conquistas salariais ganhas durante 30 paralisações dos portos do deserto nos idos de 1975 a 1988, a malta da estiva condena a malta dos camiões a andar na gandaia para fazer uns cobres.
Grandes massas humanas vivem numa democracia pejada de estrelas de bollywood e de agricultores de OGM afogados ou enforcados em dívidas
(ultimamente é mais shots de paraquato e paratião…3000 suicidas semanais na maior democracia campesiña do mundo).
O problema da democracia é que só funciona sem atrito em épocas de vacas gordas e às vezes nem isso, pois anos mais gordos que a década de 60 na mittel eurropa jamais…
O problema da democracia é a demografia
e as élites gerontocráticas que a gerem
de resto esse foi o problema da URSS e do pacto
Pouca mobilidade geracional
As élites democráticas sofrem com a pressão de grupo
SAMpayo quer alternativa ao capitalismo occidental com fio dental
talvez ao estylo cleptocrático do Haiti ou Zimbabuébué
Magalhães quer uma redecoração do gabinete ao estylo Baiano
Só ares é que diverge nuns dias quer a impressora a todo o vapor nos outros quer outro 25 de abril que ponha a sua clique no poder
noutros dias esta democracia já deu tudo o que tinha para dar
fuzile-se ou afogue-se
Quando a gerontocracia radical e reumática só produz um da chancela pré residencial que debita uma mensagem de unidade e empatia com os pacientes da piolheira
e esse tal é um militarista promovido a político
tá tude dite
craro que a eurropa se bai reinventar
O Aborrecimento é uma óptima motivação para a mudança
A perda de empatia das élites com os servos é algo que vem de longe
de zimbardo bué bué….
“Há anos que o debate se faz em torno destes pólos: há os que dizem que temos que ficar muito pior, e os que querem resistir a isso para não ficarmos tão mal.”
Como anda lá pelas lides europeias, em laboriosa preparação de projectos para o milénio, dá-se um desconto…
Porque temos de ficar pior? Simples, aliás muito simples, e é acima de tudo um problema ecológico, e não, não estou a falar de reciclar garrafas. O Planeta não tem recursos suficientes (energéticos, alimentares, etc.) para sustentar a actual população Mundial se todos vivêssemos ao nível médio de vida Europeu.
nem todos podem passar fome
cada um tem os regimes que quer…
há quem possa fazer regimes
e quem seja obrigado a dietas..bávaras ou bárbaras por nous tante nous faix….