A direita no poder quer que a sociedade se ocupe daquilo que o estado vai abandonando, mas apenas da forma que a própria direita deseja.
Há uns tempos, Pedro Passos Coelho, na esteira do inglês David Cameron, ainda ensaiou uns discursos daquilo a que chamava a “big society”, ou seja, uma “sociedade grande” que substituísse o estado nas suas funções de combate à pobreza, solidariedade social e redistribuição de riqueza. Em nenhum dos casos a ideia era para levar muito a sério, mas antes de eleição os políticos neoliberais têm tendência a inventar umas coisas para não parecerem frios e impiedosos. Esta necessidade não é nova: quem tiver memória lembrará que em 2000 George W. Bush foi eleito com uma campanha em torno do “conservadorismo compassivo”. Após a conveniência eleitoral, estas etiquetas voltam a ser guardadas, provavelmente na mesma pasta dos marqueteiros políticos de onde saíram.
Lembrei-me disto ao ver, na semana passada, as notícias sobre o despejo da Escola da Fontinha, no Porto. Como é sabido, a Escola da Fontinha era um espaço abandonado e degradado que foi ocupado, recuperado e dinamizado por um grupo de jovens, com apoio dos habitantes do bairro vizinho, que lá faziam desde aulas de recuperação a atividades artísticas. Não só a escola era abandonada como o bairro era também pobre e esquecido pelo Estado; a singularidade do projeto da Escola da Fontinha foi achar que uma escola abandonada poderia continuar a ser um local de aprendizagem para todos os envolvidos. Teria defeitos certamente, mas aprender é isso mesmo.
O país está cheio de edifícios abandonados e de gente desocupada e desmotivada. Pelos vistos, contudo, as autoridades não vêm como um sinal de uma sociedade verdadeiramente grande que pessoas motivadas encontrem ocupação para os edifícios abandonados. A direita no poder quer que a sociedade se ocupe daquilo que o estado vai abandonando, mas apenas da forma que a própria direita deseja: entregas de desperdícios alimentares, sim, ocupações com cheiro a ativismo, nem pensar. Tomada pela força policial, com o seu material destruído, a Escola da Fontinha voltou a ser um edfício abandonado e agora entaipado.
Dizia nesses tempos Pedro Passos Coelho que o estado deveria sair daquilo para que não tinha vocação.
Olhando para o último ano, percebe-se que o estado de Pedro Passos Coelho não tem vocação para quase nada: não tem vocação para defender a escola pública, não tem vocação para desenvolver o serviço nacional de saúde, não tem vocação para desenhar um modelo de desenvolvimento para o país, não tem vocação para pensar uma estratégia para a economia, não tem vocação para fazer uma diplomacia vigorosa na União Europeia, não tem vocação para ter um ministério da Cultura, e por aí afora.
É um estado com uma extraordinária falta de talento.
Resta pois ao estado de Pedro Passos Coelho concentrar-se nas poucas coisas que sabe fazer bem: cortar nas despesas sociais, vender empresas e património, obedecer às decisões da Sra. Merkel, arranjar emprego para as clientelas, e manter a estrutura de decisões no estrito quadro da partidocracia.
Mas tal como na Escola da Fontinha, este estado tem encontrado um talento até agora pouco reconhecido em Portugal: o talento para a violência e a repressão. Já tivemos um estado assim, no século XIX: um estado contra a solidariedade.
3 thoughts to “O Estado contra a solidariedade”
Caro Rui
Penso que não me enganei na pessoa, vi por acaso o programa prós e contras ontem e gostei do que vi, pela primeira vez alguém com coragem para dizer umas verdades à cerca da União Europeia. Quanto à solidariedade, prevalece a vontade da maioria, mesmo que seja inferior à da abstenção. Há portanto que manter a maioria satisfeita, pois do resto não reza a história. O que interessa como em tudo na vida, é ficar bem na fotografia. Há portanto que tomar em mãos o que é nosso e não delegar-lo em terceiros.
já tivemos um estado assis?
mas deixámos de ter quando?
as paredes das fábricas abandonadas nos anos 80 estão cheias de barracas já há quase 20 anos?
boçês nã devem vir aqui ao deserto né?
têm medo que um bombista arrebente as pontes né?
hoje faltou água durante 6 horas
lembrou-me o verão quente de 75
só faltava o calor e ter durado mais 120 horas…
bons tempos
quando a água subia os andares dos guetos
em bilhas de barro de 15 litradas
a 25$ a bilha era caro….
vivemos tempura difficilis leixar uma cousa destas sem filtrex
é simplex
Podia dezere que a escola da Fontinha apesar de ser um experimento interressante
é feyta por filhos famelga que querem reformar os netos do operariado…
é uma revolução feita por uma classe a favor do povo…
desde os tempos da Maria da Fonte e do Zé do Telhado
que o povo não consegue nem uma revoluçãozinha
ao menos uma guerrilha à remexido