Se para os portugueses João Duque recomenda a ignorância, para os estrangeiros tem uma receita simples: que os enganemos.

Por onde começar? O líder do grupo de trabalho sobre a RTP, João Duque, defende que os portugueses tenham o mínimo de informação possível sobre o que se passa no mundo, e que o mundo tenha informação falsificada e pouco credível sobre o que se passa em Portugal.

É isto, não é? Em declarações que fez ontem, João Duque disse: “Internamente, não vemos necessidade de a televisão de serviço público estar a fazer concorrência e a ter um tipo de atitude que tem a mesma lógica da actividade privada”. Nesse pressuposto defendeu o fim dos debates políticos e resumir a informação ao mínimo essencial no canal de serviço público que restar, porque “há sempre subjetividade sobre o que é uma notícia seca, objetiva” e o “o que se pretende é minimizar essa subjetividade.”

Ora, se o serviço público deixar de concorrer com o privado na informação, é natural que o contrário também aconteça, e que o privado deixe de investir, por exemplo, em jornalismo internacional e de investigação, que é caro. Se o consumidor não pode mudar de canal para onde a fasquia é mais alta, simplesmente deixa de ser necessário fazer um esforço para atingir qualquer fasquia.

(E não deixa de ser invulgar a proposta de João Duque para acabar com a subjetividade. Como não é possível emitir informação sem subjetividade, é melhor deixar de se emitir informação. Que filósofo! Em última análise, como também é impossível a João Duque emitir opinião sem subjetividade…)

Mas esperem, há melhor! Se para os portugueses João Duque recomenda a ignorância, para os estrangeiros tem uma receita simples: que os enganemos.

“A promoção de Portugal através da imagem ou do som deve ser enquadrada numa visão de política externa e portanto quase que sob a orientação ou em contrato de programa com o Ministério dos Negócios Estrangeiros”. A informação deve ser “filtrada” e “trabalhada” e este objetivo “não deve ser questionado”, defendeu João Duque, terminando com um apropriado “a bem da Nação!”

Não deixa de ser extraordinário que um presidente de um grupo de trabalho que violou os limites do seu mandato para propor a extinção da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, não tenha agora qualquer pejo em defender o regresso às práticas do Secretariado de Propaganda Nacional.

Bem. Há umas coisinhas que João Duque não percebeu. Ao defender que a informação dada ao estrangeiros seja, basicamente, a que der jeito ao governo, João Duque está a defender o equivalente informacional daquilo que o governo grego fez para entrar no euro. Suponho que nós portugueses, para nos mantermos no euro, poderíamos noticiar menos a contestação às medidas do governo e muito mais os “casos de sucesso”. Se não houver casos de sucesso, por que não inventá-los? Os gregos falsificaram as contas, nós falsificaremos a realidade.

A segunda coisa que ele se esquece é que, como anunciou a sua intenção de dar só informação conveniente, garantiu que ela nunca terá qualquer credibilidade. A terceira coisinha chama-se deontologia. Não creio que nada disto impressione João Duque.

Nos tempos do estalinismo os planos quinquenais eram sempre um sucesso — e, se não fossem, havia que declará-los como tal. Os nossos fanáticos da austeridade já devem ter percebido que os planos deles vão falhar. Resta-lhes então passar à segunda fase e, simplesmente, mentir.

5 thoughts to “O Secretariado de Propaganda Nacional

  • Augusto Küttner de Magalhães

    Caro Rui

    Nas suas cronicas, e visto por dentro será possivel?, da forma excelente como escreve e bem analisa as situaçoes, ir-nos cronicando como funciona – ou não! – o Parlamento Europeu, o Conselho Europeu, a Comissão Europeia!!!

    Quando pensamos em tanta Gente por aí…e quem manda é a Senhora Alemã, dá para pensar, para que tudo serve…

    E o papelo de Durão Barroso??? Andou estes anos todos caladinho e obediente, e agora que percebe que a Senhora – a mesma…- vai pôr na rua, é que fala!!

    um abraço

  • Zi gurate sumerium

    não é a ignorância e a escusa ao debate racional o que tem sido propalado há décadas por todas as facções?

    de resto uma televisão que cada vez é mais residual na transmissão de informação ou enfim….gasta-se muito o teclado em racionalizações sem sentido

    tem razão ó D.quixote Duques são gigantes censuratórios

    não são moinhos de consultadoria…é falta de visão deste pobre San Xô

  • Zi gurate sumerium

    os debates também são umas coisas estilizadas

    combates de 5 ou 6 galos políticos que subiram nas máquinas partidárias

    ou de uns quantos escolhidos por critérios arbitrários

    porque fazem barulho, porque têm opiniões padronizadas e é expectável o que dali saia

    há uns anos houve um ciclo de conferências de 10 mil contitos por dia

    em que um dos temas era a democratização da ciência
    (tinha o problema de só os democratas com cátedra poderem falar….
    os restantes eram como se diz….fascistas científicos no desemprego ou com bolsa

    não tinham cultura democrática

    a analogia serve?
    é queu para parábolas e hipérboles desenho muy mal

  • Para con versos de treta

    também o Manel Alegre debita as suas na SIC (notícias creio) do Bolsa na Mão
    Aquele que o Artur Portela (filhó) dizia esperar avidamente nos corredores da tecnocracia marcelista

    e em termos de pluralismo (conceito sempre muy limitado) não é a RTP o baluarte desse conceito
    (só se for a RTP memória com o A-team e os filmes e glórias do estado velho que era novo e deste novo estado que se fez velho e de meia-idade

  • Cientifismo sucia all

    Na realidade João Duque ou João Rodrigues ou outros consultores sejam de economiA ou de sociologia ou de outra coisa qualquer

    têm em geral muitos pareceres para dar
    têm de sub sub sub contratar

    e às vezes os sub sub sub contratados
    ex-alunos ex-amigos de ex-amigos ou outra fauna
    têm também as suas vidas e a paga é pouca

    se bem me lembro até houve pareceres feitos em guardanapos numa pastelaria da avenida de roma ou pertinho(uma envidraçada

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