Em resultado, Alberto João Jardim suscita também uma espécie de loucura, mas com pouco método.

1. Alberto João Jardim ganhou ontem a sua 45ª eleição consecutiva na Região Autónoma da Madeira. Como dizer qualquer coisa que não tenha sido repetida já 45 mil vezes?
Podemos começar, julgo eu, por um eleitor imaginário, que existirá certamente, e que tenha votado contra Alberto João Jardim estas 45 vezes. Essa pessoa foi sempre derrotada; se teve oportunidade disso, quis explicar ao resto do país como era o poder de Jardim na sua terra; viu as instituições da República omitirem o seu dever e permitir aquele estado de exceção. E nestas eleições ainda teve a amarga surpresa de ver o aumento do sentimento anti-madeirense no resto da República.

Na briga que Alberto João Jardim mantém com “Lisboa” essa pessoa desaparece. É lamentável, porque essa pessoa é tão portuguesa quanto os outros e foi, de certa forma, duplamente abandonada.

2. Jardim tem uma oposição interna e outra externa. Como no México do Partido Revolucionário Institucional, a sua oposição interna é fragmentária e frequentemente desmoralizada. Quanto à oposição externa, no resto da República, Jardim sabe manipulá-la com as suas erupções agressivas. Ainda ontem, após o seu discurso de vitória com as habituais invectivas contra o continente, falava com os jornalistas em inglês, citando Shakespeare. Veio-me à memória Hamlet: “será loucura, mas há método nela”.

Em resultado, Alberto João Jardim suscita também uma espécie de loucura, mas com pouco método.

A oposição interna e externa a Jardim não pode cair no mesmo tipo de folclore em que ele é o encenador e todos nós desempenhamos o nosso papel pré-determinado (Shakespeare, de novo): a cada brado exigindo a independência da Madeira, uma bátega de crónicas exigindo a expulsão da Madeira. Assim é fácil usar a oposição externa para esmagar a oposição interna.

3. É necessário fazer — nem mais nem menos — um combate cívico e judicial. Alberto João Jardim ganha eleições, é certo — e quem não as ganharia, nas condições dele? Mas isso não lhe dá o direito de governar como quer.

Será assim tão difícil, nos próximos quatro anos, recolher todos os casos de abusos e levá-los a tribunal? Será impossível saber para onde vai o dinheiro naquela região? Será que os milhões que foram dados após as chuvadas do ano passado foram mesmo gastos a fazer de novo construção em zonas de risco? Isso não pode ser levado ao Tribunal da União?

Será muito difícil fazer um WikiMadeira em que se reúnam as denúncias de quem trabalha na administração regional mas não tem coragem para fazer as denúncias necessárias? Será impossível criar no GoogleMaps uma carta georeferenciada de todos os abusos? Não é impossível. Tem sido feito noutros lugares, e com sucesso.

Não deve ser impossível também, uma vez que todas as eleições são um plebiscito a Jardim, que a oposição se junte para escolher um candidato (ou candidata) em eleições primárias, para daqui a quatro anos conseguir fazer o plebiscito anti-Jardim. Só um combate da oposição cívica conseguirá refundar a democracia na Madeira.

Nota: há dois meses lancei o desafio de se enviarem livros (um dicionário+uma gramática) para escolas de aldeia em Timor-Leste. O modus operandi não foi nada fácil de encontrar, mas hoje em ruitavares.net os interessados poderão achar os nomes das primeiras vinte escolas e instruções sobre como proceder.

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