Cada vez mais acho que a resposta correta à pergunta “o que é uma depressão?” é: esperem para ver.
O que é uma depressão? Várias respostas. Pode considerar-se que se trata de uma forma prolongada e particularmente intratável de recessão (que por sua vez costuma definir-se como “dois — ou mais — trimestres de crescimento negativo”). Pode chamar-se depressão a um período prolongado de crescimento muito abaixo (talvez dez por cento ou mais?) das linhas de tendência. Uma descrição metafórica que me agrada (não chega bem a ser uma definição) diria que uma economia deprimida é como uma pessoa deprimida: não usa todas as forças que tem disponíveis (o desemprego alto e prolongado é uma das características principais da depressão) de forma a agravar a sua situação inicial.
Mas cada vez mais acho que a resposta correta à pergunta “o que é uma depressão?” é: esperem para ver.
Não tinha de ser assim. Aliás, nada disto tinha de ser assim. A bolha do imobiliário não tinha de se tornar num crise financeira, a não ser pela total irresponsabilidade com que se deixou o setor financeiro criar produtos tóxicos com base nela. A crise do setor financeiro não tinha de se ter transformado numa crise da economia real, a não ser pela leveza das regulações à banca e aos fundos de investimentos, que puderam alavancar-se sem acautelar garantias suficientes. Se assim fosse, a crise da banca não teria tido de tornar-se numa crise dos orçamentos estatais: a Espanha estava em superavit antes da crise, a Irlanda arrisca-se agora a chegar a um défice de 32% (!) por salvar a sua banca de destruição em massa. E, finalmente, mesmo tudo isto não teria de tornar-se numa depressão, a não ser pela insistência em fazer a população comum pagar pelos erros dos predadores no topo da economia.
Se há coisa fácil de prever nesta crise é que o pensamento convencional que a provocou levará sempre a melhor na pressão sobre o debate público e a pior nas consequências reais. Quantas vezes os mesmos que endividaram o setor privado e lucraram com o crédito às famílias vieram exigir ao estado a frugalidade que nunca tiveram? E, já agora, depois de terem alavancado os seus castelos no ar, reprovaram a construção de infraestruturas que dariam emprego agora e crescimento no futuro?
Em suma, sim: é fácil prever que os opinadores do costume terão a depressão que desejam para nós. Já começaram, como de costume aliás, a fugir às suas responsabilidades, dizendo que a austeridade vem “demasiado tarde”, ou que é “demasiado pequena”.
Para quê a falta de confiança, minha gente? Este é só o PEC3, que foi consequência dos cortes no PEC2, e ao qual se seguirá o PEC4 e o PEC5. Vocês terão direito agora à nossa libra de carne, que tanto desejaram. Mais tarde, cortaremos uma perna. E depois ficarão surpreendidos por não nos mexermos, e ficarmos até mais pesados do que no início. Os cortes nos salários públicos serão acompanhados (já estão a ser) por descidas nos salários privados. A intenção deve ser que nos tornemos competitivos com o Bangla Desh e, de caminho, igualmente implacável com os pobres e os velhos. As famílias não pagarão as suas dívidas. A nossa situação no euro tornar-se-á insustentável.
O único consolo será não estarmos sós. E talvez um dia a União Europeia entenda que assim se desfaz.
4 thoughts to “Olá, depressão”
A depressão portuguesa era previsível!
http://exiladonomundo.blogspot.com/2010/09/colaboradores.html
Compreendo o alcance do problema tal como o coloca e suspeito que tenha razão quanto ao incremento da depressão que se afigura. Fico surpreendido de saber que tantos, tantos trabalhadores e trabalhadoras foram trabalhar no centenário da república, porque razão? A principal deve ser que precisam de dinheiro e a seguir que se não fossem trabalhar correriam certamente o risco de ficar sem trabalho… competição é isto… Bom, mas como é que poderemos fazer justiça e apurar as devidas responsabilidades? Parece-me a problemática mais séria de todas no meio deste caos económico-social infindável…
Recessão é quando pessoas à nossa volta perdem o emprego.
Depressão é quando nós perdemos o emprego.
bonjour, tristesse