Não, não quero ser simpático. Estamos num momento em que estes líderes têm de ouvir coisas antipáticas. Acordem! Vocês já são os piores líderes da União.
Por que é a atual geração de líderes de uma mediocridade tão confrangedora?
Eis uma pergunta que eu não queria fazer. Porque me parece lugar-comum, porque desprezo o decadentismo, porque profissionalmente voto a esta atitude uma desconfiança fria, de historiador.
Mas não há como fugir. A razão é simples: eles – Sarkozy, Brown, Merkel, Barroso, acrescentados agora de Ashton e Van Rompuy – têm falhado todos os testes. Falharam os testes a que se propuseram, e mais ainda falharam os testes que os acontecimentos lhes foram fazendo. Não há crise que não saibam desbaratar. Não há oportunidade que não façam por lhe passar ao lado. O processo do Tratado de Lisboa foi tão mau que não dá para lembrar. Quando poderiam tentar salvá-lo com duas boas nomeações, escolheram da pior forma possível duas pessoas que nunca haviam sido eleitas, não tinham currículo internacional e não mobilizariam para um diálogo nem os vizinhos do prédio deles.
Comparados com Delors, Mitterrand, Kohl e até (engulo em seco) Thatcher? Sim, até Thatcher, senhora de idéias desastrosas e franca adversária da União Europeia, tinha ao menos isso, franqueza: uma brutalidade ingénua nas idéias ingénuas, uma ingenuidade brutal nas suas idéias brutais, mas enfim, uma certa grandeza. Os outros da mesma geração, no cotejo com a História, eram de uma certa grandeza também: passaram o teste da reunificação e o do alargamento, com voluntarismo e persistência. Propuseram-se este teste e passaram-no. Mesmo quando davam pequenos passos, diziam quais eram os seus objetivos: Delors sempre afirmou que o mercado único lhe interessava para chegar à união política, nunca enganou propriamente ninguém.
E estes líderes? Têm objetivos sequer? Como é possível alguém como Angela Merkel? Eis uma senhora de um provincianismo tão profundo que consegue ser líder da Alemanha há anos sem alguma vez ter feito o esforço de comunicar com – para não falar em compreender – as gentes que vivem para lá das suas fronteiras. Que nos disse até hoje a Sra. Merkel? Nada, a não ser que, para satisfazer os preconceitos mais superficiais dos eleitores alemães, está disposta a encarar a falência das pessoas que compram os carros alemães. Às vezes acho que Merkel só existe para fazer Sarkozy parecer um visionário. À última hora, após muita hesitação e arrastar de pés, lá aceitou um acordo sobre a Grécia, um acordo confuso e obscuro, à boa maneira européia. Que entretanto se tenha namorado com a falência de estados-membros, a implosão do euro e um puro e simples colapso de sentido da União parece ter-lhe dito pouco. Recuperar deste susto será um caminho longo e custoso. Merkel deve-nos anos de vida.
E os outros líderes? Ashton e Van Rompuy foram escolhidos precisamente para não fazerem sombra a Merkel. E conseguem!
Será preciso dizer algo mais? Ashton acha que liderar a política externa européia não merece trabalhar ao fim-de-semana. Van Rompuy não se impôs enquanto Sarkozy e Merkel decidiam sozinhos.
Não, não quero ser simpático. Isso agora seria brincar no fundo do poço. Estamos num momento em que estes líderes têm de ouvir coisas antipáticas. Acordem! Vocês já são os piores líderes da União. Por este caminho, ainda se arriscam a ser os últimos.
Historiador. Deputado independente ao Parlamento Europeu pelo BE (http://twitter.com/ruitavares)
2 thoughts to “A pergunta fatal”
Concordo que os actuais líderes são maus. Que são os piores não posso arriscar: repare-se que foi a anterior geração de líderes europeus que negociou esta bagunça que é a moeda única sem instituições fortes. Vou até contra a corrente ao afirmar que os tempos de hoje são de mais democracia do que os de ontem, e esta com tendência a aumentar. Os média mainstream e alternativos ajudam-nos hoje a acompanhar o que se passa na europa e no mundo, ao passo que nos anos 80 e 90, tudo se assinava sem o menor escrutínio — veja-se a adesão de portugal à CEE sem sequer haver um referendo, ou a ratificação do tratado de maastricht, que fundou a união monetária. Em suma, penso que as sociedades amadureceram e políticos deixaram de ser os “estadistas” de fachada que eram antigamente.
Por outro lado, concedo que o provincianismo de Merkel ao olhar apenas para o seu umbigo, a ingenuidade de Sarkozy à procura do way of life francês e as aldrabices de Blair e Brown são maus de mais para ser verdade.
Rui Tavares:
Quando alguém afirma X e outro lhe pergunta «porquê?», esse alguém pode responder:
a) o que o leva a afirmar X
b) qual é, na opinião desse alguém, a causa de X
Neste caso é o próprio Rui Tavares que faz a si próprio a pergunta, porquê. Sendo uma pergunta que já me tinha passado pela cabeça, esperei, cheio de interesse, a resposta a b).
Ao invés o Rui Tavares respondeu a a).
Faço então agora a pergunta b): na opinião do Rui Tavares, qual a causa dessa situação?