A posição convencional em economia e conservadora em política não tem neste momento a mínima confiança em si mesma para aguentar um debate, em igualdade de circunstâncias, sobre como chegámos à crise e como saíremos dela.
Vamos a ver se nos entendemos. José Manuel Fernandes diz que o « Manifesto dos 28 » contra as grandes obras públicas foi recebido de forma insultuosa. Como exemplo, dá à pergunta « Onde tinham estado antes da crise estalar », que eu próprio fiz.
Esta crise é o evento económico mais significativo do pós-guerra, não só em termos de efeitos reais como de debate teórico. Perguntar onde estavam os economistas em relação à crise é um insulto? Nesse caso, perguntar « que fez o médico antes do doente morrer » é também um insulto.
Tudo bem. Posso viver com o opróbrio do insulto.
Mas, se não se importam, eu ainda prefiro saber se o meu médico duvida da penicilina. E prefiro saber que houve economistas que escreveram sobre esta crise antes dela ocorrer (citei-os aqui nesta coluna há um ano: James Galbraith, Robert Kuttner, Dean Baker, Nouriel Roubini), que há economistas portugueses que a explicaram bem e propuseram soluções que podem ser boas, e que não há desculpas para não os ouvir.
O que José Manuel Fernandes faz é desvalorizar o testemunho empírico, — o registo de quem acertou ou falhou —, para nos dizer que nos 28 estão « os mais respeitados economistas portugueses ». Este é exactamente o tipo de pensamento que nos levou à crise, tanto nos seus aspectos mais amplos como mais mesquinhos (no BPN e no BPP também estavam banqueiros « respeitáveis », como dizia Vítor Constâncio). Eu, insultuosamente, não quero saber se eles são respeitados ou respeitáveis. Eu quero é saber se eles acertaram no diagnóstico, porque isso lhes daria mais probabilidades de acertar também no remédio.
***
Os economistas que eu acho que acertaram na crise juntaram-se para escrever um manifesto. Chamemos-lhe o Novo Manifesto. A esse manifesto agregaram académicos de outras disciplinas, uma escolha que só posso supôr deliberada (e que me agrada) por romper com a ideia de que os economistas podem fazer, sozinhos, o alfa e o ómega da discussão. Nesse manifesto declaram que « o desemprego é o problema »: « Uma taxa de desemprego de 10% é o sinal de uma economia falhada, que custa a Portugal cerca de 21 mil milhões de euros por ano – a capacidade de produção que é desperdiçada, mais a despesa em custos de protecção social. Em cada ano, perde-se assim mais do que o total das despesas previstas para todas as grandes obras públicas nos próximos quinze anos. »
E qual é a reacção de José Manuel Fernandes? Para começo: que esta é « uma resposta ao lado », que é « um documento mais político e menos técnico », que « os subscritores vão da ala mais à esquerda do PS ao BE », etc. No mais: dedicou um editorial (o de sábado) a criticar um manifesto que o jornal do mesmo dia não publica e a que não dedica sequer uma notícia. Algo terá de explicar a diferença entre as parangonas dadas ao « Manifesto dos 28 » e a invisibilidade a que é remetido o « Novo Manifesto ». Num caso, primeira página. No outro, remissão para um obscuro link na internet.
Sabem? Acho tudo isto muito revelador. A posição convencional em economia e conservadora em política não tem neste momento a mínima confiança em si mesma para aguentar um debate, em igualdade de circunstâncias, sobre como chegámos à crise e como saíremos dela.
O meu desafio: publiquemos os manifestos lado a lado e tenhamos a coragem de deixar o resto para a inteligência dos leitores.
[do Público]
19 thoughts to ““O que fez antes do doente morrer?””
ora aí está o meu primeiro post aqui para o blog do Rui Tavares.já agora deixa-me fazer um bocadinho de publicidade:
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Bravo, meu amigo.
como é à borla:
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etc…
Ora nem mais!
um gajo tem de se fazer à vida
ok desculpem lá, eu sei que estou a ser um bocado “comercialmente orientado”. estava só a assinalar o facto de postar pela primeira vez aqui, como colaborador do Rui.
já agora gostava de dar também a minha opinião, penso que os investimentos são úteis, concordo tanto com o TGV como com o aéroporto. digo mesmo que já agora, e sem exagero, Portugal devia investir também nos transportes marítimos, devia ampliar-se o porto de Lisboa, qualquer coisa com módulos como no aéroporto, para também não nos endividar-mos demasiado. esse investimento poderia também contribuir para a economia
Pois tem toda a razão em pedir explicações ao médico sobre o que fez antes do doente morrer. È mais que justo.
Este País tem muitos espertinhos que vivem na penúmbra e um dia qualquer se lembram de vir “apanhar luz”, depois ” viram ” uns iluminados.
É angustiante pensar que toda aquela sabedoria, só aparece como que por magia depois…o depois é tarde…parecem os adivinhos, os magos, os bruxos que tudo adivinham, só que depois de tudo acontecer.
Dá vontade de dizer: olha olha, agora, OBRIGADO!
Torna-se tão mais facil para todos os que nunca estiveram no poder dizer o que lhes vem à cabeça. Eu nunca estive, nem estarei, logo posso também escrever uns non-sense! Mas é tão facil dizer que os 28 foram, fizeram e estiveram, e ests 50 e tal, tantos andam por aí a dar palpites há tempo demais e não se vê obra! É tão mais facil de fora atirar pedras!! Por falar nisso acho muito boa a cronica de hoje do Rui Tavares no Público e não tinha necessidade de ter escrito o ultimo paragrafo, está a mais, mas!!!!!!obrigações????
Há anos que venho sustentando que em Portugal, como de resto no resto do mundo, só há dois partidos: Davos e Porto Alegre. Mas nunca antes isso tinha sido tão bem ilustrado como agora com a existência dos dois manifestos!
Augusto Küttner de Magalhães:
Ainda que mal pergunte, o que é isso, exactamente, de «estar» no poder? Como se compara, por exemplo, o poder de um governante com o de um político da oposição? Ou o de um político com o de um empresário, dum académico, ou de uma estrela Rock?
O seu comentário cheira um bocado àquela frase do Botas: «Se soubesses o que custa mandar, gostarias de obedecer toda a vida».
Pedro Peixoto, não sei qual a base da sua comparação, não quer explicar um pouco mais!
obrigado!
José Luiz Sarmento.
Não sabendo o que é estar no Poder, tenho a percepção de !que aquilo é muito bom!, dá mordomias, salamaleques, distinções, bem-estar, etc, etc…dado que se assim não fosse o que mve tantos, tantos, tantos de todos os lados a pretender lá chegar? e parece-me!!! que aquilo tem uma espécie de “cola”, quem lá está não quer sair, quem lá esteve quer voltar, e os que nunca lá estiveram querem para lá ir!! Certo? não pnsando em espirito de missão!!! disparate!! mas talvez numa de não só servirem – todos, todos – mas também de outros servir, fosse mais oportuno, mais sincero, melhor!!! que acha?
Note Pedro Peixoto que em situções anterirores tem toda a razão quanto a Davos e Porto alegra, aqui especificamente, não estou a ver!!!
Rui, pois olhe que não entendo o melindre, pelo que me parece ninguém quer saber o que ” o médico fez antes do doente morrer “…
Se o doente morreu, paciência, enterre-se…
Se o diagnóstico foi errado, paciência…
Se o tratamento pudesse ter sido outro? ora que interessa agora?
Passou a idade dos “porquês ” .
o que as pessoas querem saber agora é porque o Pinho fez corninhos, na assembleia, porque o Ronaldo partiu o vidro do carro da moça que lhe tirava fotos e perturbava a D.Dolores,se o Sócrates está com o animal soltou ou preso, se o problema na casa do Benfica se resolve,se o Michael J deixou escrito de quem é o terceiro filho e se vai ser velado ou não em câmara ardente…
Será da ” cili sezon ” ? (tradução portuguesa)
Olhe que não, olhe que não!!!! Tudo o que refere desde Ronaldo e dinheiro exorbitantes, até mais um ministro, fazer algo como em tempos fez outro do Cavaco, é fait-divers (frances não traduzido), mas convem dar palpites positivos e viáveis,A ALbania há uns anos era uma MARAVILHA, um exemplo para alguns….que bom exemplo.
SEjamos diferentes, sejmos melhores, sejamos mais eficientes, mais correctos, mais justos, mais do que tanto falta, mas sem utopias…….
Parabéns pelo seu texto: ” O que fez antes…” Uma pergunta que pode ser assumida como um ‘acid test’ às inverdades económicas tantas vezes repetidas.
Para as políticas económicas alguém me ensinou um outro ‘acid test’:
*quem ganha?
*quem perde?
Se tudo fosse clarificado com base nessas duas perguntas quanto mais interessantes seriam todos os debates.
Em tudo e pela amostra, destes ultimos os debates, as converersa, vão versar pelo insulto pessoal, e não ppr temas….seja!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Comentário a uma crónica sua de 27/07/2009 sobre “Recibos Verdes”
Caro Rui Tavares,
Li na sua crónica, salvo erro no dia 27 de Julho, que “ninguém acabou com os recibos verdes”.
Aproveito para lhe dar a informação que houve quem tivesse acabado com os recibos verdes. O Hospital de Santa Maria, uma das maiores instituições do Estado, transformou todos os contratos a prazo em contratos por tempo indeterminado.
Este foi um desígnio da Direcção do Hospital e da Direcção de Recursos Humanos, nomeados em 2005. Como calcula isto melhorou muitíssimo a estabilidade das pessoas e o ambiente interno. Mas como não é “mau” não tem visibilidade. Tentei por várias vezes escrever sobre isto, mas as portas estão fechadas, entre elas a do “Público”. Para a direita isto é um mau exemplo. Não houve despedimentos e apesar disso e pela boa gestão desde 2005 que o hospital gasta menos. Ora o que eles gostam é de dizer mal do SNS. Para a oposição de esquerda não interessa porque pode ser favorável ao Governo. A oposição de esquerda trabalha para o voto. De modo que a nossa luta aqui, neste ponto e em outros, é uma luta solitária.
Sou adjunta da direcção clínica. As nomeações aqui foram técnicas e não politicas, como se vê pelo exemplo anexo (o meu). O director clínico integrou a lista para a Ordem dos médicos orgulhosamente minoritária de esquerda (18%). Mas claro que sabemos que os bons exemplos só servem a quem para nós tem mais interesse – o público. De resto são apagados da fotografia.
Por mim até compro guerras solitárias. Como se vê agora em relação à Associação Nacional de Farmácias, relativamente à qual nenhum partido levantou um dedo.
Tenho observado que a sua posição é de facto independente e diferente. Por isso lhe escrevo.
Um abraço
Isabel do Carmo
Cara Isabel do Carmo
Parabens pelo que aqui escreveu. Como refere se é positivo, se é bom, não dá noticia.
Todos gostam da maledicência, se não for por aí, nem sabem por onde ir.
Dizer mal, dizer mal, criticar pela negativa….
Um abraço
Augusto Küttner de Magalhães