Francisco Louçã publicou ontem, às 23:18, na sua página de facebook, uma nota intitulada “4 são mesmo 4”, na qual comenta artigos que terão aparecido na imprensa (jornais “i” e “Sol”) com a informação errónea de que os quatro fundadores do Bloco de Esquerda fossem Luís Fazenda, Miguel Portas, Francisco Louçã e Daniel Oliveira. Como escreve Louçã, “o Fernando Rosas desaparecia da história”, substituído pelo nome de Daniel Oliveira. Francisco Louçã escreve que o jornalista do primeiro artigo “tinha sido levado ao engano por uma informação de uma conversa com o Rui Tavares”, e notando que a mesma informação errónea terá saído noutro jornal, confessa-se “curioso acerca da coincidência de dois enganos tão estranhos”, concluindo que é “simplesmente uma falsificação a tentativa de retirar o Fernando [Rosas] desta história e de a refazer com novos protagonistas”.
O carácter público daquela nota obriga-me a responder também publicamente.
Como é evidente, nunca disse a qualquer jornalista, ou a qualquer pessoa, em privado ou em público, que Daniel Oliveira fosse um dos quatro fundadores do Bloco de Esquerda, e jamais omitiria o nome de Fernando Rosas para o substituir fosse por quem fosse. Conheço muito bem a história da fundação do Bloco de Esquerda e já conhecia na época vários dos seus protagonistas. Nunca mentiria nem levaria alguém “ao engano” sobre ela, porque simplesmente é coisa que nunca faço. Ponto final, parágrafo.
Adicionalmente, lamento a aparente leviandade com que Francisco Louçã extrapola em público sobre a sua curiosidade “acerca da coincidência de dois enganos tão estranhos”, ligando-a um deputado eleito em listas do seu partido, sem ter feito o mais fácil que seria telefonar a esse deputado para procurar satisfazer essa curiosidade.
Mas Francisco Louçã vai mais longe, utilizando num contexto em que citou o meu nome termos e expressões como “falsificação” e “tentativa de refazer a história” que para um historiador como eu têm implicações tão graves que não podem simplesmente passar em claro.
Eu não sou, caro Francisco Louçã, dos que refazem a história. E, politicamente, eu não sou daqueles que apagam um camarada da fotografia para lá pôr outro. Orgulho-me de ter sido aluno de Fernando Rosas e tenho por ele enorme respeito pessoal e profissional. Com ele e com outros aprendi a ser historiador e irrepreensível em matéria de facto histórico. Ninguém — nem sequer o líder do partido pelo qual fui eleito — põe em causa, em vão, a boa-fé e honestidade por que me pauto nestas questões.
Sou também, nestas matérias, absolutamente impermeável às conveniências políticas de momento. Na véspera de uma Mesa Nacional do Bloco de Esquerda, teria sido fácil a Francisco Louçã esperar para perguntar, aos muitos amigos e camaradas que tenho entre os que estiveram hoje à sua volta, se eu seria capaz de enveredar por “falsificações” ou “tentativas de refazer a história”. A minha segurança é tal que sei que todos lhe diriam que tal é impossível.
No quadro dos difíceis debates que se avizinham para a esquerda portuguesa, é de lamentar que a nota de Francisco Louçã, e a resposta que me vejo forçado a dar-lhe, possam servir de manobra de diversão.
Mas a política, e tudo na vida, faz-se respeitando a dignidade das pessoas, agindo com boa-fé e não lançando sobre elas suspeitas em filigrana. O mínimo que espero de Francisco Louçã é que esclareça a confusão que levianamente criou, peça desculpas pelo facto, e retracte o seu texto.
Rui Tavares. Bruxelas, sábado 18 de Junho de 2011.