Uma das notícias mais perturbadoras de um tempo de notícias perturbadoras foi a condenação de seis cientistas italianos, e um funcionário público, a seis anos de prisão por “homicídio multiplo”. O crime dos cientistas foi, supostamente, terem falhado em avisar as populações para os riscos de um possível sismo na região italiana de L’Aquila que, em abril de 2009, matou cerca de 300 pessoas.

Lembro-me de ter lido na época uma excelente reportagem da revista italiana L’Europeo que fazia o historial dos sismos italianos na nossa geração. O ciclo era sempre o mesmo: após o desastre, chegam milhões de euros para a reconstrução, muitos deles oriundos de fundos comunitários; estes dinheiros que são dissipados entre as mafias e as clientelas políticas; os construtores fazem os prédios novos com os materiais mais baratos que podem encontrar, metendo o resto do dinheiro ao bolso; a fiscalização não funciona, e as companhias de seguros não querem partilhar responsabilidades.

Sismo após sismo, os tribunais deixaram passar tudo isto. Em geral, a culpa morre solteira: não são responsabilizados os autarcas, nem os construtores, nem as máfias locais, nem os fiscalizadores negligentes. Desta vez, a culpa não morreu solteira. Forçaram-na a casar com os homens errados.

Estas não são falhas sísmicas reais, mas metafóricas, símbolos de uma sociedade em que a responsabilidade cívica e as possibilidades de futuro se foram afastando quando deveriam intersetar-se num ponto chamado “política”.

Deixem-me acrescentar duas outras destas falhas sísmicas metafóricas. Ambas têm implicação direta para Portugal e, no entanto, quase não têm sido discutidas.

A primeira é a que vai afastando o Reino Unido da União Europeia. Essa é só a parte visível de um movimento tectónico. As respostas políticas suscitadas pela crise da zona euro, de que o maior exemplo foi o novo tratado do “pacto orçamental”, tem como efeito que para reforçar a zona euro os líderes franco-alemães têm enfraquecido a União Europeia. O afastamento do Reino Unido é só uma consequência desse movimento oculto, — que nos deve preocupar, pois historicamente Portugal jogou sempre com a potência “marítima” britânica como compensação contra as potências “continentais” espanholas, francesas ou alemãs. Preocupa-me também porque vejo muita gente mais conformada com esta falha sísmica do que empenhada em corrigi-la.

A outra falha sísmica é a que corre no interior dos estados-membros — de que a pulsão independentista na Catalunha é agora o maior exemplo — nitidamente exacerbada pela crise da zona euro e pelas políticas de austeridade. O problema aqui não é certamente a autodeterminação catalã (pelo menos, não para mim) mas a resposta que ela pode gerar no estado central espanhol. Não tenho dúvidas de que a Catalunha pesará muito nas decisões de Madrid, em particular quando for questão de ficar ou sair do euro.

Cada uma destas falhas sísmicas representa uma falha num promessa europeia: a promessa de responsabilização e governação transparente, a promessa de unidade e a promessa de evitar o que poderíamos chamar de um “cenário jugoslavo”. Neste momento, a União não só falha nestas promessas como é mesmo o motor do seu incumprimento.

(Crónica publicada no jornal Público em 24 de Outubro de 2012)

2 thoughts to “Falhas sísmicas

  • quanto ao movimento teuctónico a placa ibérica manda avisar

    que anda a marrar com a frança desde o miocénico

    que se desligou dos pretos já há 15 milhões de anos…

    e que nem joga na liga dos anglo-saxões nem doutros teuctónicos

    a sua análise geo lógica ó cavalieri des choux de chelles

    tá seychelhes de chéché

    olha as ilhas britânicas a afastarem-se da placa ibérica…jámé…

  • signore mio te prego, piu simplex sai cosa nostra vuol dire tradizione vuol dire edificii milenari cum renda cativa e mai piu' tanti tout le monde e nessun perchee

    Pois en simplex do socratistão o probrema é nã se discutir as coisas

    há mil opinhões e nenhuma boa, de resto como este gouvernement, non pas le gouvernment c’est le regime mesmo

    temos um parque habitacional como o italiano com casas centenárias pouco resistentes a sismos e debilitadas por séculos de rendas subsidiadas para um operariado e funcionalismo sem posses

    e senhorios da thalassocracia arruinada que vê fixadas as rendas por decreto desde a 1ªrepública ou a 1ªguerra e depois mantida por mussolinis salazares só ares de bettino craxi e similares

    ódespois ao primeiro sismo obras incapazes a resitir ao movimento de uma FALHA próxima abatem-se….

    é o fado…para mais explicações pede ao filho do fernando rosas teu compincha

    cu Filipe (eta tanto filipe desde que o IV foi en bora) é estruturalmente geólogo cum blog feito…

    mas essa das mafias en edifícios con sagrados a não se mexer uma palha por serem património imutável

    lembram-me os contos incendiários dos parques naturaes atulhados de quilómetros cúbicos de manta morta,,,,

    nã sei se fui claro…mas sismicamente vosso me despeço
    P.S: pode ser por rescisão con indemnização?
    P.P.M: só ares sabe quanta propriedade da CML vai cair no próximo de grau 7 (en richter ou 8 en mercalli no funde no funde tante faz

    PCP: se a falha for a do vale do tejo…lá se vai o deserto todo….

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