Precisamos nos próximos dias de atingir metade das assinaturas dos eurodeputados, e estamos ainda longe. Se concordar com esta causa, escreva para os deputados do parlamento europeu pedindo-lhes para se juntarem a nós — e pararem com estas máquinas de matar.

Muitos milhares de mortos e amputados depois, as minas-anti pessoais — bombas-armadilha enterradas debaixo do solo que explodem quando alguém pisa nelas — são hoje consideradas das armas mais cruéis, cobardes e criminosas. Mas houve certamente um tempo em que foram consideradas grandes achados para os exércitos e para os países em risco de invasão, pois permitiam defender uma fronteira de um exército mais poderoso sem grandes custos económicos — uma mina anti-pessoal custa meia-dúzia de euros — ou de pessoal, pois elas substituíam linhas defensivas constituídas por soldados. A partir do momento em que as minas anti-pessoais se generalizaram, contudo, ficou claro que muitas das suas vítimas eram civis, em particular crianças e mulheres, que terrenos agrícolas ficam inutilizáveis muito depois dos conflitos acabarem e que os custos de desminar os terrenos são muitos maiores — às vezes dez vezes mais por cada mina — do que os custos de armadilhar o terreno. Alguém deveria ter parado com as minas anti-pessoais antes de elas se terem tornado correntes.

Algo de muito semelhante se está a passar hoje com os drones, aviões sem piloto que são comandados automaticamente ou à distância e que podem dispôr de lançadores de mísseis ou de outras armas letais para conduzir ataques assassinos. Há uns anos, nos EUA, os drones eram considerados a maravilha das maravilhas técnicas, e ainda hoje naquele país há uma verdadeira devoção militarista por estas máquinas voadoras que matam os “gajos maus” sem porem bravos soldados americanos em risco.

Como sabemos, os “gajos maus” de um lado são os bravos soldados do outro. E se a lógica dos drones vale para um lado, também para o outro valerá. Os drones nunca foram armas tão limpas quanto tentaram vendê-las: causam baixas civis desproporcionadas e, quando são abatidos, obrigam a fazer expedições ainda mais arriscadas e letais do que o normal para que a tecnologia não caia em mãos inimigas. O que aliás acontece.

A guerra era, por definição, um momento de exceção. Com os drones passa a ser possível ter um emprego das nove-às-cinco em que, de um lado do mundo, se mata gente do outro. E já se trabalha na próxima geração, a dos “enxames” de robôs voadores, que podem dispersar-se e voar em nuvem.

Os drones estão a generalizar-se. Há uns tempos descobriu-se que o regime de Bashar Al-Assad os utiliza contra a oposição síria. Não se sabe de onde vieram as máquinas, talvez sejam de produção iraniana (os iranianos conseguiram capturar drones americanos). Os israelitas produzem drones, tal como os russos, e ambos vendem drones aos turcos, que os usam contra os curdos. Volta e meia, artigos de opinião na imprensa económica aconselham a União Europeia a “não ficar para trás” na indústria dos drones. Olho para isto com um certo horror. Um dia, por exemplo quando um grupo terrorista usar um drone com armas químicas ou biológicas, descobriremos que os drones são armas cobardes, cruéis e criminosas. Mas será tarde demais para pensar.

Iniciei no Parlamento Europeu (com as minhas colegas Ana Gomes, Sabine Lösing e Sonia Alfano) uma declaração escrita para que a UE peça uma moratória no uso destas máquinas de matar. Precisamos nos próximos dias de atingir metade das assinaturas dos eurodeputados, e estamos ainda longe. Se concordar com esta causa, escreva para os deputados do parlamento europeu pedindo-lhes para se juntarem a nós — e pararem com estas máquinas de matar.

13 thoughts to “Máquinas de matar

  • Joâo Ribeiro

    De facto o tema é muito importante.

    A mina é a arma mais traumática com que tive ocasião de conviver durante largos meses no Norte de Moçambique.

    Não desista desta luta.

    Obrigado.

  • João Espanha

    Meu Caro,
    Enviei ao Público antes de conhecer o seu blog.
    Aqui vai:
    “Caro Rui Tavares,
    Sigo com atenção as suas crónicas, e tenho-o como pessoa inteligente e sagaz, pese embora em termos políticos nos situarmos em quadrantes absolutamente diferentes. Muitas vezes discordo, mas respeito, os seus pontos de vista, mas o excurso que faz sobre temas militares na sua crónica Máquinas de Matar, publicada neste jornal a 28/03/2012, padece de erros ao nível das premissas que me parecem estranhos vindos de um historiador, cuja profissão exigiria investigar a génese, função e utilizador tipo, na actualidade, das minas anti-pessoal, antes de se lançar na elaboração de um texto em que as ditas aparecem como peça central. Assim sendo, creio que desta feita é-me imposto rebater o que afirma.
    Porquê?
    Comparar uma mina antipessoal – uma arma barata, estática, cega, de massas, cuja utilização hoje não é realizada numa guerra convencional (à excepção, talvez, das posições defensivas nas guerras do Iraque) pelos exércitos ocidentais, com um drone – uma plataforma de armas móvel, state of the art, cuja função é (por norma e por enquanto) em tudo similar a uma aeronave de reconhecimento e ataque ao solo com a única diferença de não transportar um piloto (o que, ao contrário do que afirma, reduz em muito a margem de erro na missão e, consequentemente, a possibilidade de danos colaterais, entre os quais a morte de vítimas inocentes) parece-me, perdoe-me a sinceridade, completamente forçado e algo absurdo.
    Um drone é o que é: uma aeronave sem piloto. No futuro, quem sabe, dotada até de inteligência artificial. A sua criação é uma evolução lógica e não necessariamente maléfica: (i) por um lado, há décadas que é sabido que o limite de performance de uma aeronave é muitas vezes ditado pelos limites físicos do piloto (basta ver que os super-aviões de reconhecimento, como o SR-71 e o U-2, se tornaram obsoletos com o advento da tecnologia dos satélites); (ii) por outro – e aí tem toda a razão – hoje em dia é muito importante não deixar cair um piloto nas mãos do inimigo.
    E isto, por pelo menos duas razões: uma, que provavelmente pouco lhe dirá, e que respeita ao valor que representa um militar altamente treinado, seja pelo que se gastou no treino, seja pela perda do “activo” (pense no que aconteceu à Luftwaffe em 1943/45); outra, (e talvez isto o sensibilize), a circunstância de o tratamento que é dedicado aos pilotos capturados pelos actuais inimigos com os quais os exércitos ocidentais se defrontam não costuma observar as convenções internacionais relativas ao respeito pelos direitos dos prisioneiros de guerra. Levá-los a um cenário de combate que os exponha ao risco de cair nas mãos de gente deste jaez é um convite a um ingresso e degresso apressados e, logo, a um erro na detecção, aquisição e destruição do alvo. Ou seja, realizar uma missão com um avião tripulado por uma pessoa receosa do que lhe possa acontecer se for capturado torna mais provável que um inocente morra do que se a mesma tarefa for desempenhada por um drone, que por definição não tem pressa… nem medo… nem dores de barriga… nem pode ser torturado.
    Posto isto, penso que a sua tese sofre de um mal (ou bem, depende da perspectiva): é cegamente pacifista e anti-militarista. O problema, ou o seu problema, como tento demonstrar, não são os drones que, bem ao contrário das minas anti-pessoal, são armas de precisão. É a guerra. O que é respeitável, mas que surge aqui algo de cernelha e em termos muito pouco razoáveis e algo preconceituosos – isto na minha confessadamente preconceituosa perspectiva.
    Penso que aí também divergiremos: eu sou daqueles que pensa que há guerras justas. Mas isso é outro assunto.

    Portanto, saiba que subscreverei qualquer iniciativa que vise o controle ou a eliminação de armas “cegas”, como o são as minas antipessoais ou as cluster bombs. Mas saiba igualmente que, pelo menos na minha perspectiva, enquanto houver uma ideologia, uma injustiça ou uma religião que nos leve à violência, tudo o que se faça para limitar o tipo ou o número de armas só resultará quando as mesmas não possam ser utilizadas por um qualquer indivíduo só ou em grupo. A natureza humana é uma coisa chata…
    Recomendo-lhe, pois – e com todo o respeito o faço, que utilize melhor e eficazmente o seu tempo. Seja dedicando-se a outro tema, seja – caso a guerra esteja no topo das suas preocupações, a promover acções anti-belicistas gerais e porventura eficazes. Isto que tentou fazer… não. Você é capaz de muito melhor.
    Com respeitosos cumprimentos do
    João Espanha”

  • Rui Silva

    Olá.
    Gostaria de saber como escrever para os deputados do parlamento europeu pedindo-lhes para se juntarem a essa causa….
    Obrigado.
    RS

  • André

    Concordo que ajudaria colocar o endereço para onde nos estão a escrever bem claro. Seria possível?

    Muito Obrigada

    AH

  • André

    Causa justa. Concordo que ajudaria divulgar o endereço para onde nos estão pedir para escrever. Seria possível?

    Muito Obrigada

    AH

  • Augusto Küttner de Magalhães

    Tenho sempre imenso interesse e aprendo com o que o Rui Tavares escreve no Público. Normalmente estou de acordo.E aprendo.

    Mas neste texto acho que há alguma baralhaçao, quanto aos tipos de minas que refere, e efeitos.

    Mas, será que com um mundo tão desunido, uma UE em que cada um prega para seu lado, terá algum efeito assinar este abaixo-assinado??.

    Augusto

  • Quando era muy puto...

    conheci um deputado do PS que era colecionador de selos
    outro era gravador e caminhava para a fase xéxé em passos largos
    o terceiro deputado era comunista…agora pressuponho que seja ex…
    e tinha causas palermóides ucrónicas e afins

    as minas continuam existindo…e se um tipo perde as pernas por uma mina no subsolo ou por uma mina humana fanatizada tanto fax

    tamém tanto fax que quem mate seja uma máquina humanizada ou um humano mecanizado (um robotnik…rabota na rabotna

  • Quando era muy puto...

    quando era mais crescidinho vi máquinas humanas matarem vizinhos e primos para lhes ficarem com o poço ou com os cadáveres das cabras

    hoje num novo período de seca (e com armas simplex vindas da líbia)já não avançam em ondas e estripam o próximo com facas ou com pedras
    talvez a morte seja mais limpa

    mas em gente com necessidades ou fortemente motivada a preservar o seu nível de vida..matar as baratas tutsi é fácil
    mesmo quando as baratas são hutus…pecebido?
    pois tamém parecia que nã…

    eu tento outra analogia

    numa escola primária duma etária classe
    sairam 23 burocratas de baixa casta
    6 de média alta
    21 polícias
    e 16 cadáveres adiados por overdose
    o resto foi pessoal que emigrou ou se perdeu o rasto no mundo

    nenhuma dessas pessoas mesmo as que trabalham juntas
    consideram os restantes como humanos

    só eles são humanos o resto são coisas…é assim

  • And So It goes

    não sabia ler não sabia pensar era um bicho
    1901- uma eleição em guimarães

    continuava SERVO votando com os amos…ao governo pertenciam as cadeias os impostos e o recrutamento

    e a glória de deixar os ossos pela pátria ou por deus
    ou simplesmente para mostrar que existiu

    faz do homem uma biomáquina que funcionará durante muito tempo..
    uns centos de milhares de anos pelo menos

    as máquinas inorgânicas sucumbirão na crise energética…
    gasta-se muita energia a exterminar os competidores com máquinas
    10 ou 30 mil mortos custaram biliões

    os líbios e os targui fazem isso nuns meses
    e a maior parte cai de fome pelo caminho que é uma morte limpa
    sem sangue…

  • Sonia Serralha

    As máquinas matam, temos de acabar com elas todas.

  • Augusto Küttner de Magalhães

    Sonia, nem todas as máquinas matam!

    um abraço

    Augusto

  • Luciano Morais

    Ao caro João Espanha,
    É bom ver alguém admitindo abertamente ser a favor da guerra, quando a considera justa. O problema é que o conceito de justiça não é privilégio de europeus ou americanos: cada um tem o seu. Os “inimigos terroristas” não consideram sua guerra somente “justa”, mas também “santa”.
    Por isso, lamento sua posição e apoio o eurodeputado Rui Tavares. Os armamentos e seus usos precisam ser regulados por questões morais e substituídos por ações sociais de diálogo e jurisprudência cada vez mais eficientes, que nos favoreçam no diálogo com as diferenças cada vez mais chocantes em um mundo cada vez menor (não gostaria da palavra “globalizado”). Retribuir essas diferenças com armas cada vez mais eficientes é apostar na violência que, deveríamos ter prendido com a história a que você se dirige, só gerará mais violência, senão imediatamente, a longo prazo.
    Cordialmente,
    Luciano Morais
    São Paulo, Brasil.

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