Pode dizer-se que tudo é possível sob o poder mais forte, mas isso só é verdade quando o mais fraco consente.

Peguemos no tratado da União Europeia, artigo 3, sobre os objetivos da União. O que vemos? Que entre os objetivos da União se encontra (além do mercado único, um espaço de livre-circulação e uma moeda comum) o pleno emprego e o progresso social, a promoção da justiça e da proteção sociais, a coesão económica, social e territorial e — prepare-se — a solidariedade entre os estados-membros. A questão é: isto é para levar a sério? A resposta é: sim.

Estes objetivos servem de guias para as instituições da União e, em particular, para a Comissão Europeia, que tem obrigações especiais que a fazem ser conhecida como a “guardiã dos Tratados”. Mas não só: também o Banco Central Europeu, segundo o artigo 282, deve dar “apoio às políticas económicas gerais na União para contribuir para a realização dos objectivos desta”. Uma instituição ou agência da União não pode ter, para mais de forma continuada, uma ação contrária aos objetivos desta.

E aqui chegamos ao ponto crucial. Estas duas instituições da União — a Comissão e o Banco Central Europeu — fazem parte de uma velha conhecida nossa: a troika. E enquanto membros da troika, com muita amplitude e uma boa dose de arbitrariedade, impõem e fazem implementar, todos os dias, medidas que têm efeitos contrários aos objetivos da União. Como pode ser isto?

Pode dizer-se que não o fazem sozinhas, pois o terceiro elemento da troika é o Fundo Monetário Internacional. E aí levanta-se um terceiro problema. Quem manda na troika? Como se tomam as decisões nela? Com que base legal? Onde está o acordo entre a União Europeia e o FMI? Quem o ratificou? Tal acordo não existe. A troika é uma instituição ad hoc, com poderes que não se percebe de onde vêm, decisões que não se sabe como são tomadas e persistindo em medidas cujos efeitos se revelam contrários aos objetivos da União. Que fazer perante isto?

***

Uma organização de tratado, como a União Europeia, é uma construção delicada — e as suas competências são apenas as que estão nos textos que a regem. É no mínimo duvidoso que a Comissão e o BCE possam fazer aquilo que fazem na troika, da maneira como o fazem, e com os efeitos conhecidos e previsíveis da sua ação.

Ora, é um facto que Portugal pediu um resgate financeiro, mas isso não justifica tudo o que possa acontecer durante o resgate. E é um facto que a Comissão e o BCE fazem parte do resgate por causa de um pedido do estado português, mas nem esse facto lhes permite irem reiteradamente contra os objetivos da União.

Pode dizer-se que tudo é possível sob o poder mais forte, mas isso só é verdade quando o mais fraco consente.

Infelizmente, se a troika for ilegal, só o governo do estado-membro sob programa poderia levar o caso a tribunal. Cabe ao governo português, no nosso caso, defender junto das instituições europeias, e se necessário for perante o Tribunal de Justiça da UE, o interesse do seu povo e o princípio da igualdade dos estados-membros perante os tratados.

Escrevo “infelizmente”, porque este governo come e cala, e até colabora, sem levar a sério as suas obrigações. Mas a questão impõe-se: se a troika for ilegal, ou mesmo que só parcialmente legal, qual será a posição de cada um dos partidos representados no parlamento? O que farão, se um dia tiverem a maioria dos votos?

(Crónica publicada no jornal Público em 06 de Novembro de 2013)

9 thoughts to “E se a troika for ilegal?

  • Miguel

    Caro Rui, a Troika não tem poderes, por isso não precisa de existência legal. A Troika nem sequer existe no papel. São 3 entidades que se dispõe a emprestar dinheiro sob certas condições.
    Por isso a Troika é tão ilegal como qualquer grupo de 3 pessoas que decidam comprar dívida Portuguesa. Só o fazem se virem progressos.

  • Aurélio Malva

    Ou seja, ilegal ou pelo menos inscontitucional tem sido e é a actuação do governo.

  • Dr. Cupretinho de Obama

    há tanta ilegalidade pá…ninguém precisa de aceitar os ditames

    pode-se sair da união

    pode-se sair do euro

    pode-se e é o mais fácil deixar de pagar a credores e ao pessoal cu estado emprega

    pode-se sair do país a pé se necessário

    que nem toda a gente ganha 10 mil de subsídio como tu pá

    Entrades seleccionades amb l’etiquetaPublicaImporta des de DriveReverteix a esborranySuprimeix les entrades seleccionades

    25

    1-25 de 38 Entrades més recents1Entrades més antigues

    DOS MOTES FRACOTES – QUER INVERSÃO POLAR COM EXPORTAÇÃO DE INFLAÇÃO ?
    É PARA LEVAR OU COMER JÁ?
    FAST FOOD EM 1500 EMPRESAS MUNICIPAIS E ESTATAIS CUSTAM TANTO COMO AS 118 PPP’S QUE EM 2005 SÓ CUSTAVAM 475 MILHÕES E SE 80 PPP’S FORAM CRIADAS DEPOIS DE 2000
    A LUSOPONTE JÁ ANDA POR AÍ PARADA COMO SOÍA DIZER-SE EM INTERNETÊS FAZ TEMPO OU TEMPURA E ANDAR PARADO COM 2500 KILOMETROS DE AUTO-ESTRADA NÃO FAz sentido né

    ISABEL DO CARMO DIZ QUE NÃO HÁ BOMBISTA QU’AGUENTE ESTE ESTADO MAS PROVAVELMENTE CONSEGUE AGUENTAR O SALAZAR DA AULA MAGNA…

  • Dr. Cupretinho de Obama

    inscon? bolas este governo é inscon?

    o seguinte deve ser mascon…..

    os seguintes….num país energeticamente dependente e semi-insolvente

    basta ver a indústria de transformação agro-alimentar
    e silvo-mobiliária-imobiliária

    a electro-arco vai enviar 50 soldadores para bruxelas ou pró fundo de desemprego uma dessas

    uma indústria tão promissora que dura desde 1937….

  • Percebemos quase tudo é uma lei para os pobres de espírito né? ou uma lei dos pobres de espírito?

    vineri, 15 noiembrie 2013

    É A TROIKA ILEGAL WELL IS UNCLEAR BECAUSE THE TROIKA IS A VIRTUAL ENTITY MADE BY POLITICAL NON EN TI TIES COM MUITOS TIES EN TI AND TEA FOR TWO NUM TEA PARTY ESQUIZOFRÉNICO QUE SE ENTORTA QUANDO SE ENDIREITA E SE ENDIREITA QUANDO SE ENTORTA
    O PROblema nessa inequação é não existirem novos sujeitos políticos, num mundo monopolizado pelos velhos, basta ver que soares vai a Paris receber as chaves de qualquer coisa, lançar um livro e um discurso em péssimo francês, comparando a democracia à ditadura e alienando ainda mais quem é abstencionista militante.
    Logo o que joga neste jogo é mais uma brigada do reumático que dá congressos laudatórios sem contraditórios ao estilo da velhinha CCCP.
    Não se debate nada, é o país em simplex do mais simples
    basta ver o bailinho do soares ilhéu alberto joão…
    corsário das ilhas maravilhas

    TRIUMVIRATUM

    TRIUMVIR

    TRIUMVIRI…..SUNT DREI….TREI…TRE…TREE….NUM VEJO A RAIZ QUADRADA NO THREE…
    Publicat de Banda in troika barbara de varvar…varvata…é sans écrite né…

    Etichete: É A TROIKA EM LETRA MORTA LATINA TRIUMVIRUM

    EGYPT – THE DEMOCRACY IN SMALL CUTS
    THE NOMENKLATURA SAYS THAT NO MAN BORN OF WOMAN WILL HURT MACBETH

  • Vasco

    Boa noite,
    sou leitor assíduo e diário do “Público”. Costumo ler com particular interesse as suas crónicas na última página. Leio todas mas com a sua identifico-me com muita regularidade. Leio com admiração pois partilho de muitas das suas opiniões que considero muito sérias e construtivas,sobretudo no que diz respeito à esquerda. li com especial atenção a sua crónica em vésperas de autárquicas onde apela ao voto no partido socialista em Lisboa. Onde fala de José sá Fernandes que tem um percurso na CML que acompanho também com muita atenção. Reconheço algum bom trabalho ,pouco, a este senhor que é para mim uma das maiores desilusões da política portuguesa dos últimos tempos. Reconheço algum bom trabalho ,como disse, mas paralelamente conheço o que muito de mal fez ou permitiu fazer,da sua arrogância e desprezo para quem ousa discordar dele,desconfio até de muitas outras coisas no que a ele diz respeito.Não me vou alongar porque não quero falar de terceiros aqui. Acabei de ver uma foto sua com ele. O meu interesse, que era genuíno no seu novo partido termina aqui. Porque como diz o ditado ” diz-me com quem andas , dirte-ei quem és”. Continuo a acreditar que acredita nas pessoas, mas neste caso concreto e nesta pessoa em particular deixei de acreditar já há algum tempo.Por razões que conheço muito bem. Não votei onde indicou nas autárquicas por duas razões, muito fortes, Sá Fernandes,em que já acreditei e Manuel Salgado.Não podia votar em qualquer um deles. Depois disto vou continuar à esquerda mas ainda sem partido.

  • Fernando Paulino

    As palavras derrubam muros.

    Sou de Setúbal, professor e escritor, 52 anos, gostava de saber como posso ajudar a construir esta nova esquerda.

  • cassandro

    nenhum pais europeu isoladamentepode aguentar os desafios do seculo 21. nenhum pais pode aguentar os desafios do seculo 21 se continuarem a eleger neo-liberais nos respectivos estados-membros, os quais depois vão constituir o conselho europeu (que na practica agora governa esta nova UE do tratado de lisboa, sob a tutela do FMI e da bnca anglo-saxonica)
    portanto, sem restituirem a UE comseus objectivos originais de uniao verdadeira, ninguem no continente europeu tem futuro.
    e cmo as pessoas so sabem olhar parao saudosopassado,e nunca pro futuro,é isso que estão a escolher.e a TROIKA ajuda-vos,descansem

  • Ideals

    Um excelente artigo, realmente. Lembro-me que recomendo o uso de salas de dados virtuais para manter as informações de negócios protegidos perfeitamente contra espionagem e vazamento de dados.

Leave a comment

Skip to content