A direita europeia, que tanto quis consagrar a herança cristã na construção da União Europeia, talvez pudesse reconhecer ao menos as palavra de Jesus a Pedro, quando este, no Evangelho de São Mateus, lhe pergunta se haveria de perdoar sete vezes: “sete vezes, não — mas setenta vezes sete”.

O primeiro-ministro descreveu como irresponsável um manifesto assinado por setenta economistas, patrões, sindicalistas, políticos e ex-governantes, todos defendendo a reestruturação da dívida portuguesa como condição sine qua non para que a economia possa crescer. Passos Coelho não tem razão. Ele considera que os signatários do manifesto pecam por excesso. No máximo, eles pecariam por defeito. Mas é um pecado menor.

O único problema do manifesto é ser de setenta portugueses, e não de setenta vezes sete, que poderiam ser portugueses, gregos, irlandeses, cipriotas, italianos, espanhóis e — porque não? — alemães.

Nesse manifesto pan-europeu com que sonho, dir-se-ia a mesma coisa, mas multiplicada: que as economias precisam de ser aliviadas da canga da dívida para poder crescer e não só pagar mais sustentadamente a dívida que resta como pelo efeito agregado do seu crescimento, contribuir mais para construir um novo sistema europeu na qual, em vez de ganharem uns para os outros perderem, todos os componentes da economia da União seriam complementares aos outros.

Nesse manifesto dir-se-iam três coisas.

A primeira é que a União deveria realizar uma grande conferência económico-financeira até ao fim deste ano, aproveitando a eleição do novo Parlamento e da nova Comissão Europeia. O tema princípal dessa conferência seria a resolução da dívida, seja pelo prolongamento dos seus prazos, seja pela reestruturação da dívida acima dos 60% do PIB (como pede o manifesto nacional, num caso e no outro), seja pelo perdão direto de dívidas.

A segunda é que a União precisa de se livrar definitivamente do FMI e encontrar um mecanismo de estabilidade inteiramente comunitarizado. O Bretton Woods europeu a que se referiu o parágrafo anterior redundaria num fundo monetário europeu, mas com um mandato mais extenso, pois teria de obedecer aos objetivos da União expressos no artigo 3 do Tratado da UE: pleno emprego, coesão, solidariedade.

A terceira é que os países periféricos não têm só um problema orçamental, mas um problema económico que só pode ser encarado, pelo menos, no médio prazo. Para isso é preciso um equivalente a um Plano Marshall para estes países, que lhes permitam qualificar a sua força de trabalho, especializar as suas exportações e, em poucas palavras, valorizarem-se na economia global. E porque haveriam os países centrais de fazer isso? Porque o relançamento e a reconversão das economias periféricas tornaria os seus países menos dependentes e mais sustentáveis.

Isto significa que os autores do manifesto estão certos. Mas estão mais certos ainda quando relembram que a reestruturação da dívida interessa também a todos os parceiros europeus.

Não há pecado em perdoar dívidas. O perdão da dívida faz parte da história da dívida, desde os tempos bíblicos em que de cinquenta em cinquenta anos  se libertavam escravos e perdoavam os devedores. A direita europeia, que tanto quis consagrar a herança cristã na construção da União Europeia, talvez pudesse reconhecer ao menos as palavra de Jesus a Pedro, quando este, no Evangelho de São Mateus, lhe pergunta se haveria de perdoar sete vezes: “sete vezes, não — mas setenta vezes sete”.

(Crónica publicada no jornal Público em 12 de Março de 2014)

2 thoughts to “70×7

  • 666 vezes 666 vezes 666 vezes ....

    A primeira é que a União é uma potência em declínio, se a população mundial crescia graças às vagas de emigrantes europeus numa europa muito acima dos seus recursos nos últimos 50 anos do século XIX e isso apesar das crises de 1848 a 1870….

    A europa passa dos 270 milhões em 1848 para 425 milhões em 1900 isso mais milhão ou menos milhão, apesar de nesses anos a Filoxera e o míldio e o oídio (o da vinha e o da batateira) terem levado a êxodos de dezenas de milhões de europeus e à morte de alguns milhões

    bom se nesses anos de revolta, guerra, fome a populaça teve um crescimento de 40% essa tendência digamos demográfica-económica é abruptamente cortada com o advento que fará 100 anos daqui a uns meses, pois se em 1914 a população aumentara 8% em menos de 14 anos para mais de 460 milhões a partir daí a população estagna e envelhece e três guerras globais de controlo económico depois
    a europa afunda-se no marasmo

    No início do século XX a europa vivia uma era de optimismo alimentada pela prosperidade, a revolução industrial trazia a concentração urbana e o êxodo rural retirando a muitos a independência alimentar e logo a independência económica

    de 1848 para 1900 a população da grande Londres triplicou atingindo os 7 milhões e meio e atingiu essa prosperidade dominando 30 milhões de quilómetros quadrados e impondo um comércio global de quinquilharias e de drogas

    Os territórios britânicos excediam em mais de 90 vezes o das ilhas, a frança dominava uma área vinte vezes superior à sua área continental, Holanda e Portugal idem e mesmo a Alemanha tinha uma área considerável e dominava 13% do comércio mundial
    A europa no seu conjunto dominava as rotas comerciais e apesar das perdas espanholas com a aquisição americana de 1898 ainda tinha a primazia marítima mundial e mais de 50% do comércio global mesmo excluindo o império russo

    Logo até podia realizar uma grande conferência económico-financeira até ao fim deste ano da gurra da CRIMEIA 2014, aproveitando a eleição do novo Parlamento e da nova Comissão Europeia, QUE DEVEM PARECER-SE MUITO COM A DIETA ALEMÃ EM 1932 MAS ENFIM, NUMA EUROPA EM QUE ATÉ VENEZA QUER PROCLAMAR A INDEPENDÊNCIA ECONÓMICA NUMA UNIÃO DE ESTADOS ITALIANOS COM APENAS 150 ANOS O tema princípal dessa conferência seria NÃO a resolução da dívida, MAS A SOBREVIVÊNCIA DA PRÓPRIA UNIÃO …seja pelo ALTERAÇÃO DAS POLÍTICAS QUE POSSAM RENOVAR A PROSPERIDADE ECONÓMICA DE OUTRORA, seja pela reestruturação DE UMA dívida QUE NINGUÉM QUER ASSUMIR acima dos 10 OU DOS 20 OU MESMO DOS 60% OU DOS 100% do PIB, seja pelo perdão direto de dívidas DOS PAÍSES QUE ABANDONAREM A UNIÃO SEJAM ELES A ESCÓCIA OU O REINO UNIDO, OU VENEZA E A CATALUNHA OU O QUE SE QUISER CHAMAR À WALLONIE OU A OUTRO FRAGMENTO EUROPEU.

    A segunda é que a União SEM FORÇA OU SEM INTERESSE PARA OBRIGAR OS ESTADOS A LIBERTAREM-SE DA PRISÃO DO CRÉDITO CHINÊS OU HINDU NÃO precisa de se livrar definitivamente do FMI, POIS AINDA É UM DOS MECANISMOS FINANCEIROS QUE CONTROLA PARCIALMENTE E REDUZ OS ÓDIOS INTERNOS QUE FRAGMENTARÃO A UNIÃO DESVIANDO-OS PARA UMA TROIKA APÁTRIDA e EVITANDO ASSIM um mecanismo de estabilidade inteiramente comunitarizado QUE DIFICILMENTE SE CONSEGUIRÁ IMPOR NUMA EUROPA MUITO DIVIDIDA ECONOMICAMENTE E DIFERENCIALMENTE ENDIVIDADA

    O Bretton Woods NÃO FOI europeu E NEM PODERIA SER POIS A EUROPA É APENAS UMA PARTE DE UM COMPLEXO FIDUCIÁRIO MAIS VASTO E redundaria num DESASTRE UM fundo monetário europeu QUE CRIASSE APENAS MAIS DÍVIDA E INFLAÇÃO NUM MUNDO EM QUE O pleno emprego É IMPOSSÍVEL MESMO METENDO 10 MILHÕES DE ROMENOS E BÚLGAROS A CAVAREM BATATAS OU VALAS DE ESGOTOS , A coesão É O QUE SE VÊ E solidariedade NEM COM A SICÍLIA NEM COM O ALBERTO JOÃO

    A terceira OU MESMO A 69ª é que os países periféricos não têm só um problema orçamental, mas um problema SOCIAL DESDE HÁ MUITO
    DO QUAL O económico É APENAS UM REFLEXO que NÃO QUER ser encarado, pelo menos, noS ÚLTIMOS 30 ANOS

    Para isso é preciso um equivalente a um Plano Marshall para TODOS OS PAÍSES DA EUROPA SEM EGOÍSMOS NACIONAIS NEM MANIFESTOS XÉXÉS E GÁGÁS, EGOÍSMOS NACIONAIS NÃO TORNAM AS VÁRIAS EUROPAS mais sustentáveis.
    MANIFESTAÇÕES ANARQUISTAS OU NEO-NACIONALISTAS COMO AS ESPAÑOLAS AS GREGAS AS UCRANIANAS NÃO JOGAM O JOGO DA UNIÃO

    JOGAM PELA FRAGMENTAÇÃO….

  • Paris já está a bruler?

    I think behavioral finance has done its job (unmasking the ideology of financial markets superpower efficiency), but there’s much to do about BE in other areas.

    By the way, I would very much appreciate some feedback on this idea: “the EMH as it is interpreted today faces a conflict to refute simultaneously two of the most relevant concepts in the behaviorist literature: the excess volatility (Shiller 1981) and the limits of arbitrage (Shleifer and Vishny 1997).”

    Thks!
    Reply
    Replies

    Russian’s buy 213 billion euros to Eurozone and the remaining EEC11:26 PM

    And sell only 140 billion’s or less

    behavioral finance says that eecis going to lose more with the ukranian economic comic war

    than US of A,,,

    economy is a mad bitch boy…

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